Artigo publicado na Liinc em Revista. , v.02, p.10 – 27, 2006
Nelson De Luca Pretto
A partir de cenas distantes mais de um século, que descrevem aspectos educacionais e
tecnológicos, o artigo analisa as políticas públicas brasileiras em educação relacionando-as com
as políticas de cultura, telecomunicações e ciência e tecnologia. As profundas transformações
trazidas pelas tecnologias da informação e comunicação trazem para a educação desafios muito
grandes, especialmente com a internet, ao contribuírem com as profundas modificações na forma
de ser e de pensar da humanidade. Destaca-se a implementação da política de adoção de software
livre no Governo Federal, do incentivo da cultura digital e da discussão sobre o sistema
brasileiro de TV Digital sendo que, no entanto, pouco se faz no campo da formação de
professores. A lógica linear de currículo não dá conta desses desafios e propomos uma outra
concepção de currículo inserido na lógica hipertextual.
Palavras-chave
tecnologia da informação, tecnologia educacional, internet, currículo, políticas
públicas
Abstract
The paper begins describing educational and technological scenes apart centuries.
Brazilian education policies are analyzed within the context of culture, telecommunications,
science and technology policies. The great transformations that have taken place in the realms of
information and communication technologies (ICT) – Internet in particular – bring great
challenges to education, because these technologies contribute to the transformation of the way
of we think and behave. The paper highlights the open source movement inside the Federal
Government, promotion of a digital culture and discussion about a Brazilian Digital Television
System, however little is being done at the level of teacher training and development. The linear
rationale of curriculum is unable to deal with these challenges and we propose another curricular
approach, based on hypertextual logic.
Keywords information technology, educational technology, internet, curriculum, public policies
Cena 1 – parte 1
O Dr. Winter era diferente. Nunca ficava parado dentro da casa com o
aluno. Levava-o para passear pelo campo, explicava-lhe que a Terra era
redonda como uma laranja e achatada nos pólos. Apontava à noite para
as estrelas e dizia-lhes os nomes e as distâncias que se encontravam da
Terra. E quando dava lições de Botânica era mostrando as plantas de
verdade e não apenas gravuras dos livros. Tinha uma magnífica lente de
cabo madrepérola com a qual fazia o aluno examinar flores e folhas, talos
de relva ou gomos de laranjas e bergamotas. De que são feitas as nuvens?
Por que é que quando a gente solta um livro que tem na mão o livro cai?
Como é que a água se transforma em gelo? Por que é que existem o dia, a
noite e as estações do ano? O Dr. Winter explicava todas essas coisas a
Licurgo, que as achava fantásticas, impossíveis (VERÍSSIMO, 1962, p.
494)
Cena 1 – parte 2
Nos fandangos já não dançam tanto a chimarria, o tatu e a meia-canha: o
que querem é valsa, chótis, mazurca, polca, essas bobagens
estrangeiradas.Se há coisa que me da quizília é ver esses tais postes do
telégrafo, quando ando viajando pela campanha.Se eu fosse governo
mandava derrubar tudo.Onde já se viu passar bilhete pra outra pessoa por
um arame?Isso é até uma pouca vergonha, porque se eu quero dar algum
recado, justo um chasque, arranjo um próprio ou vou eu mesmo
(VERÍSSIMO, 1962, p. 546).
Cena 2 – parte 1
Como já descrevi em outro artigo (PRETTO, 1999), cena2 que
descrevo aqui, aconteceu em junho de 1999, numa pequena cidade
no interior da Bahia, Brasil. Numa sala de aula de um curso de
especialização em um município do interior na Bahia, uma dezena
de professores e professoras. Uma das características deste
município é ter resolvido parcialmente o problema de formação do
professorado: lá, praticamente todos possuem curso de magistério
e passaram por um concurso público bastante rigoroso.
No meio de uma discussão sobre desigualdades sociais, uma
professora-aluna afirma que, no século passado, a classe
dominante brasileira viajava para a Europa de trem, ao contrário do
que acontece atualmente quando os ricos só viajam de avião. A
professora que ministrava o curso, construtivista por natureza e
preocupada com esta afirmativa, tenta empurrar a turma para
discutir um pouco mais a afirmação. A discussão avança e um
novo argumento surge: isso não poderia ser verdade porque no
final do século passado ainda não existiam trens. Mais pressão da
professora e alguém, meio encabulado, balbucia que isso não era
possível por causa da água que existe entre o Brasil e a Europa.
Chegando-se à esta conclusão, a professora tenta puxar da turma o
nome do oceano. Surge, então, o oceano Pacífico.
Cena dois – parte 2
Me sentei no banco da praça, abri o notebook e me conectei à internet de
banda larga sem fio, gratuitamente – e livre do risco de ter meu
equipamento roubado. Não, eu não estava no Japão, nos Estados Unidos
ou num outro país rico. Esse lugar fica no Brasil, numa cidade chamada
Sud Mennucci, que fica no interior de São Paulo e tem apenas 7.363
habitantes. De tão pequena, Sud Mennucci permite dispensar o carro. […]
Por que uma cidade tão bucólica avançou tão rapidamente na tecnologia
de acesso à internet? […] Hoje, 120 das 1.714 casas da cidade já
desfrutam do benefício, sem pagar nada. Se para a maioria das pessoas
Wi-Fi é sinônimo de internet móvel, em Sud Mennucci significa inclusão
digital (ARIMA, 2005).
As transformações que estamos vivendo no mundo contemporâneo são de tamanha magnitude
que nos parece curioso as tais estrangeiradas descritas no antológico O tempo e o vento de Erico
Veríssimo, no final do século XIX, ao se falar do recém criado telégrafo (Cena 1 – parte 2). As
transformações tecnológicas são de tal monta que hoje, em praticamente todos os lugares do
planeta, o chamado fenômeno da globalização – objeto de críticas contundentes em praticamente
todos os cantos! (Cf. PRETTO, 2001) – chega aos mais remotos locais através de alguma
conexão tecnológica. Os benefícios (e os estragos, claro!) não são pequenos e, para enfrentá-los,
necessitamos de políticas públicas, particularmente para a área da educação, que modifiquem
radicalmente as cenas com que estamos acostumados a ver quando nos referimos ao sistema
educacional, de ontem e de hoje, trazendo para o nosso cotidiano um verdadeiro impasse. As
tecnologias de informação e comunicação (TIC), especialmente a rede internet, ao contribuírem
com as profundas modificações na forma de ser e de pensar da humanidade, também
possibilitam novas formas de organização e mobilização da juventude. A meninada foi para rua,
em Salvador (PRETTO, 2006) e em Madrid3, mas também em diversos outros cantos do mundo,
articulando-se através das redes, tecnológicas ou não. Esses movimentos apresentaram resultados
visíveis em vários países, em diversos campos, da cultura à política, passando pela ciência e
tecnologia. Desenvolve-se, meio na marra, é bem verdade, a uma certa cultura tecnológica,
ligada diretamente à emergência dessas tecnologias da informação e da comunicação, que nos
impõe pensar as práticas educativas em estreita articulação com diversos outros campos do
saber.
Ao longo dos mais de três anos de governo Lula, percebemos diversas modificações na
composição de vários ministérios, entre os quais da Educação, Comunicações e Ciência &
Tecnologia, todos de elevada importância para a área educacional. A mudança de seus titulares,
equipes e políticas trouxe-nos à tona, como de sempre, a possibilidade (e a esperança!) de
implantação de políticas públicas que superassem a visão esquizofrênica de poder que tem
caracterizado a política brasileira.
No campo das políticas para a educação, a cultura, a ciência e a tecnologia, ainda estamos vendo
propostas que não se articulam, como se cada ministério fosse responsável pela solução dos
problemas brasileiros a partir de uma atuação isolada em cada área. Urge pensarmos o Brasil de
forma mais global, coerente com o mundo contemporâneo e o que pretendo aqui é fazer um
exercício em torno de meia dúzia de pontos, buscando apresentar algumas pistas para a
implementação de políticas públicas integradas e integradoras para a área educacional, sem, no
entanto, ficar prisioneiro desta.
Mesmo com as desarticulações dessas políticas, percebemos alguns avanços nestes últimos anos
e gostaria de destacar a política de introdução do software livre (softwares não-proprietários ) na
administração federal, com particular destaque para a ação do MEC em lançar edital do Proinfo
(Programa Nacional de Informática na Educação) para compra de computadores incluindo a
possibilidade do software livre, o que era praticamente impensável num passado bem recente.
Também merece destaque o processo de migração da desejável plataforma de EAD e-Proinfo
para software livre, mesmo estando esse processo marcado por enorme lentidão, e sem ainda a
total disponibilização do código fonte.
No âmbito do Ministério da Cultura, foi criada uma assessoria especial para a cultural digital e
lançado um corajoso edital, hoje já na segunda edição, de apoio à produção de jogos eletrônicos
nacionais (JOGOS BR, 2006), inicialmente previsto para ser apenas com software livre, hoje em
múltiplas plataformas, algo de grande importância para a educação, a cultura, a ciência e a
tecnologia nacional. Iniciativas como essas se constituem em marcante valorização da nossa
cultura, a digital ou a analógica! Em paralelo, estamos vendo a implantação dos Pontos de
Cultura do programa Cultura Viva (2006), espaços para a produção multimídia digital, o qual já
implantou em todo o Brasil, em sua primeira fase, iniciada em 2005, em torno de 300 pontos
através do lançamento de editais, viabilizando assim a instalação de estúdios multimídia para
serem geridos pelos próprios jovens aglutinados em torno das ONGs, associações e
universidades que apresentaram as propostas. Esses pontos, articulados nacionalmente usando
diversos recursos tecnológicos, dentre os quais o sítio Conversê (2006), têm possibilitado grande
movimentação das comunidades locais visando a produção de sons e imagens e, o que é mais
importante, a produção colaborativa de conhecimento e o estabelecimento de novas redes de
relacionamentos.
Na Casa Civil da Presidência da República, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação
(ITI), autarquia federal, tem importante papel na construção das políticas de software livre no
Governo Federal, que, através Decreto de 29 de outubro de 2003, criou oito comitês técnicos
com o objetivo de coordenar e articular o planejamento e a implementação de software livre e
inclusão digital, entre outras ações ligadas à área, sendo hoje o ITI coordenador do Comitê
Técnico de Implementação de Software Livre. Também sob sua responsabilidade está o Projeto
Casas Brasil (2006), com o objetivo de “levar inclusão digital, cidadania, cultura e lazer às
comunidades de baixa renda”.
No Ministério do Planejamento, a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI),
coordenadora do programa de governo eletrônico, com políticas de inclusão e a política de
migração para software livre do Governo Federal, publicou um guia para facilitar esse processo.
Essas experiências e políticas, ricas por sua própria natureza, carecem, no entanto, de uma mais
forte interação (entre si, mas que não é objeto deste texto) e, principalmente, carecem de uma
maior interação com os sistemas de educação.
Na busca de minimizar essa distância entre as políticas propostas, estamos, modestamente,
tentando fazer essa integração no município de Irecê, na Bahia, através do ponto de cultura
Ciberparque Anísio Teixeira (2006), um projeto que inclui os nossos Tabuleiros Digitais4, onde
buscamos articular essas experiências com um programa de formação de professores implantado
no município pela Faculdade de Educação da UFBA, o qual tem uma proposta curricular
centrada em bases diferenciadas dos chamados currículos tradicionais (Cf. PRETTO, 2005), do
que voltaremos a tratar mais adiante.
Esses movimentos do Governo Federal nesta área são, sem dúvida, significativos mas, no meu
entendimento, ainda não atacamos um dos pontos mais críticos para a educação brasileira: a
formação de professores. Não podemos continuar a pensar em políticas que busquem
simplesmente treiná-los e, muito menos, certificá-los através de cursos de formação,
normalmente aligeirados. No início deste governo chegou-se a pensar na idéia, absolutamente
lamentável, de implantação de mecanismos de certificação de professores que indicavam, desde
a sua gênese, como um de seus princípios, o estímulo à competição entre os profissionais da
educação, através de pagamento de bolsas de incentivo. Parece que a lógica do ranking e da
competição terminou sendo inculcada em nossa sociedade, de tal forma que as políticas públicas
terminam, também elas, sendo vistas como competidoras entre si.
A desarticulação do sistema de educação nacional tem sido a marca mais forte dos tempos atuais,
sendo que a expansão desordenada e o estímulo à entrada do setor privado na educação superior
levaram o conjunto de faculdades e universidades brasileiras a adotarem estratégias de marketing
que se assemelham à venda de títulos de clubes sociais ou blocos de carnaval (Cf. PRETTO,
2006b).
Sabemos que o sistema público de ensino superior possui inúmeros problemas que precisam ser
atacados. Mesmo com todas as dificuldades, ainda encontramos espaço para fortalecer a idéia de
que é função da universidade pensar sobre o seu próprio futuro e não simplesmente sair correndo
atrás da produção de artigos e publicações de qualquer tipo para acumular pontos num sistema de
avaliação que mais se parece com um taxímetro marcando o valor de uma corrida. Uma corrida
pelos números! O que tem destruído, quase cotidianamente, a universidade pública brasileira é
essa idéia de considerar que o mercado resolve tudo, instalando-se uma lógica – perversa! – de
ranking, estimulando a competição e o individualismo. Na Bahia chegou-se ao extremo disso
quando a própria Universidade Federal – a UFBA – caiu nessa armadilha e, a partir da avaliação
realizada por um órgão de imprensa, foi para as ruas com um outdoor proclamando ter “a melhor
graduação do Norte e Nordeste”. Esta idéia de competição, de estar na frente, não condiz,
obviamente, com aquilo que entendemos ser o ethos universitário, com o fato de uma
universidade ser pública justamente pela sua função pública, e pela sua obrigação de criar
conceitos e não de ser uma mera reprodutora de lógicas de mercado.
A presença das tecnologias e as transformações do currículo
A internet é uma rede mundial de comunicação e de processamento de dados e informações, cujo
suporte material é de redes de conexões digitais entre diversos computadores espalhados pelo
mundo inteiro, estando diretamente associada ao conjunto de transformações no modo de pensar
e conviver da humanidade. Para isso, necessário se faz, obviamente, garantir o acesso a todos,
professores, alunos e a sociedade em geral, mas também compreender a lógica de funcionamento
dos novos meios de comunicação e informação, e isso exige uma profunda transformação das
práticas pedagógicas em vigor no sistema formal de ensino. A novidade dessas novas tecnologias
para o âmbito educacional reside, justamente, no fato do desenvolvimento técnico-científico
implicar no rompimento de padrões de organização e de funcionamento da vida social, bem
como dos modelos de representação dessa realidade, exigindo de cada um de nós, professores, a
indispensável problematização da prática pedagógica, passando, necessariamente, pelo
redimensionamento da concepção e pelo desenvolvimento do currículo. Dos currículos! A lógica
linear de currículo, seja a antiga grade ou as já não tão modernas matrizes, não dá conta desses
desafios. Como já me referi, o que estamos propondo nos projetos de formação de professores
que estão sendo implantados na UFBA pela Faculdade de Educação é uma outra concepção de
currículo inserido na lógica hipertextual. Pensamos, portanto, no currículo como um hipertexto,
como um verdadeiro labirinto. Dentro desta perspectiva, ele assume a função de uma interface,
porque é um elemento estratégico para propiciar a mobilização integral de todos os envolvidos
com a produção/difusão do conhecimento. Ou seja, o currículo não estaria única e rigidamente
voltado para o desenvolvimento racional, com base no pensamento abstrato, mas para a
integração razão-emoção, revalorizando, na construção do conhecimento e na representação do
real, a articulação do imaginário com a abstração, da subjetividade com a objetividade, do
trabalho com o prazer – a integração do lado direito com o lado esquerdo do cérebro.
Por outro lado, o currículo como uma interface se refere ao seu compromisso com a
interatividade, de modo a colocá-lo como meio/fim estratégico para a produção coletiva do
conhecimento, para o pensar coletivo. Nesse sentido, a organização dos conteúdos pedagógicos
não se pode dar de maneira linear, geralmente vertical, mas de modo a ser, o currículo, um
articulador das diversas disciplinas, flexível, ágil, dinâmico, interativo, integrado, heterogêneo,
simultâneo, à maneira própria do pensar coletivo, atendendo às demandas da comunidade
escolar, da sociedade em geral, da produção cultural, dos questionamentos teóricos e
metodológicos do fazer pedagógico na contemporaneidade.
Tentando dar uma maior visibilidade a esta nova concepção de currículo, articulamos, no
Programa de Formação de Professores da Faced/UFBA, através dos projetos de formação para
professores de Irecê e de Salvador, de modo integrado e simultâneo, áreas de conhecimento que
possam ser combinadas de acordo com os interesses dos estudantes e pesquisadores,
contemplando a multiplicidade de olhares sobre os objetos do conhecimento. O que se quer é
fortalecer a heterogeneidade do grupo, buscando um caminhar coletivo que respeite e considere
essas diferenças. As diferenças enquanto elementos fundadores desses processos, e não apenas
como ilustradores das diversidades. Ou seja, aqui, o que se busca é o enaltecimento da diferença
e não a sua simples aceitação.
Assim, passam os professores a (re)assumir o papel de lideranças educacionais – e
conseqüentemente políticas – que articulam um movimento maior de revalorização das culturas
locais, uma vez que estas passam a estar, cada dia mais, disponibilizadas pelos velozes meios de
comunicação eletrônica. Essa é uma demanda que exige políticas públicas pensadas no conjunto,
com o objetivo de fortalecer a formação e o trabalho docente.
Políticas públicas de formação
As políticas públicas para a viabilização destas concepções de currículo exigem ações das mais
diversificadas e não limitadas apenas a um ou dois Ministérios. Para a educação, que todos
consideram como sendo fundamental para a superação das gritantes desigualdades sociais
presentes em todo o planeta, precisamos de ações que envolvam, no mínimo, os Ministérios mais
ligados ao tema: Educação, Cultura, Esportes, Comunicações e Ciência & Tecnologia.
A título de exemplo, poderíamos pensar que o Ministério da Cultura, com o seu potencial em
termos de museus, acervos e patrimônio histórico, com a sua política de incentivo à produção
audiovisual, poderia associar-se ao da Educação num programa de incentivo à formação de
professores, de modo que estes ampliem o conhecimento das diversas culturas presentes no país.
Nossos professores não vão ao cinema, ao teatro, a museus, e usam muito pouco as bibliotecas –
quando elas existem e são decentemente equipadas… Parece coisa simples, mas torna-se
necessário atacar essa questão de forma urgente e global, com a implantação de mecanismos de
incentivo e catalisadores de ações nesse sentido, como, por exemplo, o estabelecimento de um
generoso programa de apoio à ida de professores a eventos, a partir de uma negociação mais
ampla com os produtores e distribuidores.
De outro lado, para que ações como essas e tantas outras sejam possíveis, precisamos de
professores qualificados desde a sua formação inicial, sendo fundamental o envolvimento das
Faculdades de Educação, em especial aquelas das universidades públicas. Vejo como
fundamental, para uma radical transformação da educação no país, uma intensificação do uso das
tecnologias de informação e comunicação e, em especial, o desenvolvimento da educação a
distância (EaD). Para tanto, necessário se faz pensar em políticas que garantam o pleno
envolvimento dos estudantes das Faculdades de Educação em programas que adotem plenamente
essas tecnologias na sua formação, já que serão eles os futuros professores dos sistemas
educacionais.
As dificuldades enfrentadas pelo governo na busca de uma reforma no sistema universitário
brasileiro não podem ser impeditivo para que ações possam ser desencadeadas no sentido de
apoiar e considerar as Faculdades de Educação do sistema público universitário, como parceiras
do MEC nessa empreitada. Torna-se urgente buscar a implantação de políticas públicas que
articulem de forma intensa as Faced, de modo a incentivá-las e apoiá-las para a realização de
programas e projetos de intervenção, visando uma profunda transformação da educação em suas
regiões de atuação. As Faced se constituem num potencial humano e intelectual incomensurável.
Não resta a menor dúvida que também elas sofrem de todas as conhecidas mazelas do sistema
público de ensino superior e, justamente por isso, precisam estar envolvidas de forma efetiva.
Não são poucas as experiências que poderiam ser estimuladas através de ações concretas dos
ministérios, no sentido de modificar radicalmente a atual formação dos futuros profissionais da
educação. São inúmeras as possibilidades, e gostaria aqui de destacar apenas algumas. Por
exemplo, um programa de fortalecimento das suas bibliotecas – com livros, vídeos, filmes da
literatura brasileira e estrangeira e computadores conectados -, apoiado simultaneamente pelos
Ministérios da Cultura e da Educação, poderia representar um salto significativo na formação de
professores conhecedores e leitores críticos da cultura nacional, que, desse modo, estimulariam
seus alunos a um maior contato com os elementos culturais do país e do planeta. Em paralelo,
com o objetivo de atender ao ensino presencial e, principalmente, a educação a distância, torna-
se necessário disponibilizar na internet obras de autores brasileiros, e também estrangeiros, por
exemplo, através de articulações entre os Ministérios da Educação, Cultura, Ciência &
Tecnologia e Comunicações, e destes com a iniciativa privada, mediante uma ampla negociação
com as editoras, visando a produção de livros eletrônicos (e-books), atendendo indiretamente,
também, toda a comunidade lusófona, que cada dia mais se articula através da internet. Já é um
avanço em termos de políticas públicas o Portal Domínio Público (2006). elaborado pelo MEC
(em software livre, diga-se de passagem) e lançado em 2004 com 500 títulos, já possuindo,
conforme sua página na internet, 14 mil títulos entre textos, vídeos, imagens e sons
De outro lado, e cada vez mais, torna-se necessária a intensificação da produção regionalizada de
programas de televisão e vídeo, como, aliás, já se discute no âmbito das telecomunicações. Já
não são poucas as universidades públicas brasileiras que possuem verdadeiros canais de
televisão, sem apoio para a produção e com uma capacidade ociosa relativamente grande. É,
portanto, urgente incentivar experiências envolvendo, por exemplo, as Faculdades de
Comunicação e Educação e os canais universitários, que fortalecidos, poderiam estar também
produzindo programas para uma alimentação mais descentralizada da TV Escola e das emissoras
do sistema público de televisão educativa. Além disso, em todas as cidades “cabeadas” para TV
por assinatura, estão sendo montados, ou já existem, canais universitários que utilizam uma
programação realizada precariamente – exceto provavelmente nos maiores centros urbanos
(como de costume!) – e com uma sub-utilização do tempo disponível para as emissões, tempo
esse que poderia ser aproveitado a partir do incentivo a outras produções de forma a atender a
sociedade em geral, e para as escolas e universidades, em particular. E, aqui, não estamos
falando em programação didática ou educativa, com aquela velha lógica da infantilização da
linguagem, mas de produtos culturais plenos, para serem usados e aproveitados – e por que não
manipulados e modificados! – por cidadãos também plenos.
Mais uma vez, é lamentável a dificuldade que o MEC tem em atender as instituições formadoras
da mesma forma que busca atender as escolas. No processo de migração do TV Escola para o TV
Escola Digital e DVD Escola, novamente não foi previsto disponibilizar às Faculdades de
Educação o mesmo material que foi fornecido às escolas do ensino básico e, com isso,
possibilitar que os futuros professores possam estar preparados para trabalhar com o material que
eles vão encontrar nas suas práticas cotidianas em sala de aula. No governo passado, quando da
implantação do TV Escola, sentimos falta e isso foi objeto de muita crítica (Cf. BARRETO,
2001) e, atualmente, com a migração para a chamada TV Escola Digital/DVD Escola esse
problema poderia ter sido sanado e, no entanto, não houve nenhuma atenção por parte do MEC
no sentido de modificar esta relação com as FACED. Para se ter uma idéia, foram atendidas,
segundo o MEC, “50 mil escolas públicas de ensino básico com um aparelho de reprodução de
DVD e uma caixa com 50 mídias DVD, contendo, aproximadamente, 150 horas de programação
produzida pela TV Escola”, ao passo que não houve nenhum trabalho com as instituições
públicas formadoras de professores.
Mais uma vez, essas são pequenas ações que podem contribuir para a criação de uma massa
crítica de alunos e professores que possam atuar de forma plena no mundo contemporâneo,
construindo-o de forma coletiva e com intensa participação de todos. Em quase todos os casos
anteriormente referidos, não resta dúvida que necessário se faz garantir o acesso e, para isso, as
políticas de inclusão são fundamentais.
Inclusão sociodigital
Quando se fala em acesso, imediatamente nos vem à mente a chamada inclusão digital. No
entanto, isso é muito mais do que ter acesso às máquinas. É o exercício da cidadania na interação
com o mundo da informação e da comunicação. As máquinas e a conexão são condições
necessárias, claro, mas não são suficientes. Por isso, as políticas públicas brasileiras precisam
estar voltadas para esses dois aspectos desse único processo, sem desprezar a qualificação dos
profissionais que atuam na área. Nesse campo, temos que retomar a temática do financiamento e,
com isso, reafirmar o absurdo de estarmos, há mais de quatro anos, sem usar os mais de quatro
bilhões de reais do FUST (Fundo de Universalização dos Serviços das Telecomunicações), por
conta de imbróglios jurídicos que refletem a luta de interesses do grande capital internacional e
que só beneficiam a política econômica apoiada pelo FMI. Os recursos do FUST têm servido
quase que exclusivamente para aumentar o superávit fiscal do Governo, uma vez que eles têm
sido sistematicamente contingenciados pelo Tesouro. O Tribunal de Contas da União (TCU)
realizou uma auditoria buscando compreender o porque desses recursos não estarem sendo
utilizados. Segundo esse Relatório, na proposta orçamentária encaminhada ao Congresso
Nacional pelo Governo Federal para o exercício de 2006, “quase todos os recursos do FUST – a
arrecadação anual média do fundo é de cerca de R$650 milhões – estavam contingenciados”
(RELATÓRIO…, 2006, p. 34). Ainda de acordo com o Relatório, o TCU recomenda que a Casa
Civil seja a responsável pela coordenação da aplicação dos recursos do FUST e dos programas
de inclusão digital. Porém o Presidente da República, através do decreto no 5581, de 11 de
novembro de 2005, definiu novas atribuições do Minicom, dando-lhe a responsabilidade de
coordenar as ações de inclusão digital do Governo Federal (FÓRUM NACIONAL PELA
DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO, 2006), gerando, mais uma vez, apreensão para
aqueles que atuam nas políticas de inclusão digital. A coordenação dos programas de inclusão do
Governo, teoricamente, deveria estar com o Comitê de Inclusão Digital do Governo Eletrônico,
ligado ao Ministério do Planejamento. A revista Arede (2005), em seu número de dezembro de
2005, numa matéria de capa sobre inclusão digital (também disponível na internet), apresentou
uma tabela com todos os projetos do Governo Federal e das estatais para a área. Em 2005 foram
aplicados (efetivamente empenhados) R$ 213,38 milhões em programas e projetos de inclusão
digital, sendo 18 programas ou ações, de âmbito nacional, regional ou setorial, desenvolvidos por
oito ministérios, uma secretaria, quatro empresas estatais e uma fundação. Ao total, diz a
matéria, são mais de 4,4 mil telecentros em todo o Brasil. Mesmo com todos esses esforços, os
números, no caso específico da internet, são ainda muito preocupantes, apesar de já constatarmos
uma grande modificação em termos de acesso. Pesquisa do Núcleo de Informação e
Coordenação do Comitê Gestor da Internet (2006) mostra-nos que apenas 16,6% dos domicílios
brasileiros têm computadores de mesa, enquanto 95,7% tem aparelhos de TV e 91,6% rádio.
Segundo a pesquisa, pouco menos de 10% dos brasileiros utilizam a internet diariamente sendo
que 67,8% dos pesquisados nunca usaram a internet. Todos os dados apontam claramente para a
mesma estratificação social dos demais indicadores da sociedade brasileira e, com a internet, a
regra é seguida: apenas 11,96% dos entrevistados da Classe A nunca usaram a internet enquanto
que nas Classes D e E esse percentual é de 87,56 %.
Os movimentos de inclusão digital crescem, mas precisamos urgentemente qualificar essa
chamada inclusão, não a reduzindo ao fornecimento de aulas de planilhas eletrônicas ou
processadores de texto e, o pior, com treinamentos para o uso de software proprietário, num
verdadeiro adestramento que, em última instância, causa dependência, como em tudo que
fazemos sem um apurado senso crítico. Além disso, se não tomarmos cuidado, as fundamentais
experiências vividas em muitos telecentros ou similares poderão não contribuir
significativamente para a imersão dos jovens na cultura digital, uma vez que, em muitos casos,
apesar da boa vontade e do grande envolvimento dos participantes desses projetos, algumas das
experiências são cercadas de tantos cuidados e senões, que não possibilitam uma verdadeira
imersão na cibercultura. De novo, corremos o risco de alimentar o fosso entre pobres e ricos, já
que os jovens que possuem o acesso individualizado em casa – muitas vezes em banda larga –
interagem plenamente com a cibercultura vivendo, em seus quartos fechados, todas as
possibilidades, da cópia e manipulação de música (com os já famosos mp3 e ogg), vídeos, bate
papos e sítios de toda natureza. Enquanto isso, aos filhos dos pobres… aulas de informática!!!
Já se fala no analfabeto digital, aquele que não possui qualquer familiaridade com o mundo da
informática, e tal designação expressa a importância que cada vez mais é atribuída ao
computador e às suas múltiplas formas de uso, a ponto de se estabelecer uma analogia com a
incapacidade de ler e escrever, carência esta que nem de longe pode ser tolerada. Também já é
quase consenso que a exclusão digital é óbice para que se alcance a cidadania plena.
Além do Fust – brevemente já referido – outra grande possibilidade que se vislumbra está ligada
às potencialidades da televisão digital. O tema já vem sendo bastante analisado tanto política
como academicamente5, mas creio que ainda é pouco discutido no meio educacional. No início
do governo Lula, uma profunda mudança de rota foi introduzida a partir do Decreto 4.901, de
26/11/2003, que instituiu o Sistema Brasileiro de Televisão Digital – SBTVD (BRASIL, 2003).
A questão fundamental que se colocou quando da edição deste Decreto e a mudança de rumo
referida é que, a partir de então, o governo brasileiro passou a trabalhar não mais na perspectiva
da escolha entre os sistema disponíveis – o norte-americano (ATSC), o europeu (DVB) e o
japonês (ISDB) –, mas, sim, na busca de uma definição mais precisa sobre o que efetivamente
queremos com a televisão digital no Brasil. O que se busca é evitar cair na solução de
simplesmente investir no aperfeiçoamento das tecnologias de transmissão com o objetivo de
aumentar a qualidade de transmissão do que se produz. Isso não basta porque, obviamente, não
possibilitaria que novas e importantes expressões da cultura brasileira, mescladas e interagindo
com a planetária, pudessem ter mais espaço, “de forma a garantir a primazia do interesse público
em detrimento de interesses privados” (INTERVOZES, 2006, p. 13).
O Movimento Intervozes tem tido uma marcante atuação nessa discussão e trago aqui as
reflexões propostas no documento divulgado em janeiro de 2006, com uma importante
contribuição exatamente porque considera, assim como temos enfatizado em nosso grupo de
pesquisa, a importância de políticas públicas que considerem o interesse público acima do
privado e que busquem, cotidianamente, a formação de um cidadão pleno, produtor de cultura e
conhecimento e não um mero consumidor. No caso da TV Digital, essa perspectiva educacional
é fundamental já que não podemos permitir que TV aberta brasileira – não custa repetir: uma
concessão pública a ser explorada por tempo determinado! – não se torne “prioritariamente uma
ferramenta de indução do consumo” (INTERVOZES, 2006, p. 14).
Mais uma vez, como nos referimos no caso das televisões universitárias e educativas, a questão
da produção de conteúdo torna-se fundamental para a TV Digital e, principalmente, para a
educação. Isso porque a relação da televisão digital com a educação começa a despontar como
sendo uma das grandes possibilidades de transformação da educação e, para isso, a escola
precisa se apropriar das tecnologias de comunicação, mas de forma não instrumental (PRETTO,
1996).
Mestres do amanhã
Todas essas tecnologias, portanto, precisam estar presentes na escola, concorrendo para que esta
deixe de ser mera consumidora de informações produzidas alhures e passe a se transformar –
cada escola, cada professor e cada criança! – em produtora de cultura e conhecimento. Cada
escola, assim, passa a ser um espaço de produção, amplificação e multiplicação de culturas,
apropriando-se das tecnologias e, contemporaneamente, compreendendo que essa incorporação
passa por uma outra batalha – e aqui falo no sentido literal da palavra – que é a da adoção do
software livre como elemento estimulador e propiciador de uma lógica colaborativa,
característica fundamental desse movimento. Nesse aspecto, e aqui não vou me deter no tema
apesar de achá-lo de fundamental importância, os diversos grupos que se aglutinam em torno do
Projeto de Software Livre (2006) têm desenvolvido importantes ações, auxiliando escolas,
prefeituras, governos, ONGs no sentido de favorecer a migração do software proprietário para o
software livre.
Isso tudo – e em paralelo – está associado à urgente necessidade de se redefinir o marco
regulador para a área, nos possibilitará garantir que não tenhamos essa absurda concentração na
propriedade dos meios de comunicação – todos eles, analógicos e digitais -, passando pelo rádio,
televisão, imprensa, editoras e gravadoras. Do ponto de vista tecnológico, o que vislumbramos
para um futuro que já é presente, é a necessidade de políticas públicas que garantam às escolas e
grupos comunitários, o acesso a esses equipamentos – cada vez menores, mais poderosos e com
menores custos – de forma a transformar as escolas em verdadeiras emissoras de rádio e
televisão. Anísio Teixeira já dizia e queria isso desde a década de 60. É emblemático o seu artigo
Mestres de Amanhã, disponível na Biblioteca Virtual Anísio Teixeira (2006) do Prossiga. Anísio
se perguntava sobre a importância desses recursos tecnológicos e ele mesmo indicava as
possibilidades:
Porque são extraordinários os recursos tecnológicos que terá para se
fazer um mestre da civilização científica, podendo para isto utilizar o
cinema como forma descritiva e narrativa e a televisão como forma de
acesso a mestres maiores que ele. O mestre seria algo como um operador
dos recursos tecnológicos modernos para a apresentação e o estudo da
cultura moderna, e como estaria, assim, rodeado e envolvido pelo
equipamento e pela tecnologia produzida pela ciência, não lhe seria
difícil ensinar o método e a disciplina intelectual do saber que tudo isso
produziu e continua a produzir. A sua escola de amanhã lembrará muito
mais um laboratório, uma oficina, uma estação de televisão do que a
escola de ontem e ainda de hoje. (TEIXEIRA, 1963).
Anísio antevia, na década de 1960, o papel das tecnologias disponíveis à época. Hoje, elas
ganharam o mundo e estão mexendo com o nosso cotidiano, especialmente se nos referimos às
tecnologias de informação e comunicação, trabalhando com softwares livres. Torna-se
necessário e urgente que os educadores possam experimentar mais as possibilidades de criar
emissoras de rádio e televisão geradas a partir de um ou dois computadores com meia dúzia de
equipamentos para produção, gravação e geração, oferecendo alternativa aos assustadores
números de audiência da TV comercial brasileira, que faz com que cerca de 85% da população
brasileira assista diariamente a um único e mesmo canal, para ver a mesma coisa! Aos
educadores cabe também assumir mais efetivamente a discussão sobre a TV Digital no país, uma
vez que o grande desafio para o desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Televisão Digital é
buscar implantar um sistema que possibilite a interatividade no sentido pleno, com participação
também plena de cada cidadão, na definição coletiva dos rumos dos acontecimentos, e não
apenas na possibilidade de escolhas predeterminadas, também definidas longe de cada contexto.
Para a educação e a cultura, a busca de um sistema de televisão digital assim como as políticas
de adoção do software livre passam a ser estratégicas, incluindo aí a necessária adoção do digital
como elemento da cultura. As ações já referidas do Ministério da Cultura têm muito contribuído,
mas é básico a sua integração com o sistema educacional, em todos os níveis, de tal forma que a
implantação desses estúdios multimídias (Pontos de Cultura) pelo Brasil afora possa significar,
também, o envolvimento de professores e estudantes num continum de produção cultural que nos
possibilite vislumbrar, para um futuro bem próximo, tais tecnologias não apenas disponíveis aos
já privilegiados das classes média e alta.
Queria, como já fiz outras vezes, trazer as palavras de Gilberto Gil, Ministro de Estado da
Cultura, sobre o tema:
O que está implicado aqui é que o uso da tecnologia digital muda os
comportamentos. O uso pleno da internet e do software livre cria
fantásticas possibilidades de democratizar os acessos à informação e ao
conhecimento: maximizar os potenciais dos bens e serviços culturais,
amplificar os valores que formam o nosso repertório comum e, portanto,
a nossa cultura e potencializar a produção cultural, criando, até, novas
formas de arte. A tecnologia sempre foi instrumento de inclusão social,
mas, agora, adquire novo contorno, não mais como incorporação ao
mercado, mas como incorporação à cidadania e ao mercado, garantindo o
acesso à informação e barateando os custos dos meios de produção
multimídia através das novas ferramentas que ampliam o potencial
crítico do cidadão. Somos cidadãos e consumidores, emissores e
receptores de saber e informação, seres, ao mesmo tempo, autônomos e
conectados em redes, que são a nova forma de coletividade. (GIL, s.i)
Parece que essa lógica de espalhamento de informações (broadcasting), que o tempo inteiro
permeou o tradicional sistema de comunicação, marcou-nos de forma muito forte tanto em
termos da produção cultural como de educação. Os movimentos de resistência a essa perspectiva
sempre existiram e se fortalecem, entre tantas outras razões, pela expressão do movimento do
software livre, particularmente com os Wikis 6 e todos os softwares que possibilitam uma
produção coletiva de conhecimento. Tudo isso, está mexendo violentamente com nossa forma de
pensar, produzir e, principalmente, pensar sobre o que produzimos.
Para encerrar, creio ser importante mencionar a questão dos direitos autorais, do copyleft (2006),
do CreativeCommons (2006), política dos arquivos e publicações abertas (2006), enfim, de todo
esse universo de produção que pensa mais no coletivo do que no individual, de tal forma que
esses princípios possam, proliferando-se, interferirem de forma mais contundente na definição
dos novos marcos regulatórios para o setor e também para o desenvolvimento científico e
tecnológico da área.
Estamos convencidos de que a escola contemporânea, e junto com ela todos os espaços de
aprendizagem, em qualquer que seja o nível, não pode ficar indiferente e se furtar ao exame das
possibilidades de uso dessas tecnologias no espaço pedagógico, enquanto elemento estruturante
de novos processos educacionais, trazendo para o cenário da escola a formação de produtores de
proposições, de culturas e conhecimentos e não de simples consumidores de informações.
Para nós, falar em inclusão é articular temas como acesso às máquinas, conexão, software livre,
universalização de serviços de comunicação, cidadania plena e transformação da escola em
espaço de produção de cultura, em cada contexto na qual ela se insere. Ou seja, falamos de
inclusão sociodigital.
Esses pontos, e muitos outros, configuram uma concepção horizontal, sem centro e cooperativa
de políticas públicas, que apontam, potencialmente, para a implantação de processos educativos
consistentes com a contemporaneidade.
1
Este artigo é resultado parcial da pesquisa Políticas Públicas Brasileiras em Educação, Tecnologia da
Informação e Comunicação, e conta com a participação de Darlene Almada Soares, bolsista de IC/CNPq.
Coordenador do Grupo de Pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias [http://www.faced.ufba.br/gec]
2
Relato de Maria Inez Carvalho, professora da Faculdade de Educação da UFBA.
3
Referência ao movimento dos jovens espanhóis a partir da manipulação governamental a partir do ato
terrorista na estação de Atocha, em 19 de outubro de 2004.
4
Os Tabuleiros Digitais foram desenvolvidos pela Faculdade de Educação como sendo móveis de forte
inspiração com a cultura da Bahia, com computadores rodando software livre, constituindo-se em espaço livre para
as navegações na rede, de forma rápida, espalhados pelas áreas livres da Faculdade de Educação da Universidade
Federal da Bahia. Ver Tabuleiros Digitais (2006).
5
Entre tantas outras referências, destaco o livro Mídias digitais: convergência tecnológica e inclusão social
(BARBOSA FILHO, et al., 2005).
6
Definição de wiki (2006) e exemplo de um pode ser encontrado num dos melhores exemplos de produção
colaborativa da internet, a Wikipedia.
Referências
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21 fev. 2005.
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