Nelson Pretto – professor associado da Faculdade de Educação/UFBA e visitante da Universidade Trent de Nottingham. www.pretto.info

Daqui da Inglaterra, leio em A Tarde um belo projeto de intercâmbio de estudantes, promovido pelo Teatro Vila Velha. Aqui mesmo nesta página, já escrevi algumas vezes sobre a necessidade de promovermos políticas públicas que estimulem os jovens – de qualquer idade, claro! – a passearem mais. Falo diretamente na palavra passear, pois é isso que penso ser fundamental para ajudar na formação dessa meninada. Conhecer novos lugares, novas cidades e seus povos, outras culturas. Mesmo compreendendo que o nosso mundo contemporâneo resolveu partir para a mesmice, onde as coisas que vejo aqui na pequena Nottingham, são quase todas absolutamente iguais às que vejo aí em Salvador, creio que esses passeios e intercâmbios são fundamentais para a formação dessa gente, inclusive para que possamos, com muita garra, lutar contra esta lógica de tudo virar o igual. Hoje, andar de ônibus por quase todos os países ocidentais, é passar pelos mesmos pontos de ônibus que temos em Salvador. A mesma empresa, o mesmo modelo, o mesmo estilo, enfim, a mesmice implantada, como uma comida fast food, que aí, ou aqui, é sempre a mesma. Achar o diferente, requer garimpar com profundidade.

Os filhos das classes médias e altas, têm a oportunidade das viagens promovidas pelas próprias famílias. Conhecem museus, praças, cidades, estradas, ruas, enfim, se não ficarem nos tradicionais roteiros pré-fabricados pela indústria do turismo, podem integragir um pouco mais com as culturas de outros países. Ao filhos das classes populares, resta esperar por políticas públicas que favorecem essa mobilidade, que possibilitem que esta turma, possa conhecer e interagir com outras turmas de outros países. Projetos como esses do Vila, Axé, Eletrocoperativa, Breje Eró, e de tantos outros grupos liderados pelas ONGs, brasileiras e estrangeiras que investem no país, são exemplos de belas oportunidades para uma juventude que pode não estar vendo muita esperança no futuro que se avizinha. Mas me pergunto: porque isso não faz parte das políticas públicas dos governos municipal, estadual e federal? Por que não viabilizar que alunos – e , claro, os professores – possam passar períodos em outras cidades, estados e países, em projetos de intercâmbio de forma mais permanente? Isso, seguramente, também traria para a Bahia, outras gentes, turmas e tribos que, interagindo com a nossa meninada, certamente fariam diferença no mundo de hoje. Um mundo que carece de genorisade, de companheirismo e de solidariedade. Penso que esta força da juventude é única posibilidade de uma radical transformação na mesmice do mundo atual. Porém, tais idéias, nem sempre são bem acolhidas.

Certa vez, numa festa do Bonfim, encontro um amigo querido que gosto muito de ouvir. Assim que nos vemos, ele me provoca: tenho te lido e tenho minhas dúvidas sobre esse seu encantamento juvenil! Fiquei muito intrigado com o comentário, pois respeito bastante esse meu amigo de longas datas. Com aquilo na cabeça, e a cada manifestação desta turma jovem, me perguntava mais uma vez: estou exagerando ou essa meninada está recuperando uma energia sufocada ao longo dos últimos anos e que, agora, volta a se manifestar como uma rebeldia necessária para a vitalidade do mundo?
Recentemente aqui na Inglaterra, uma turma de não mais de 30 jovens, entre 18 e 25 anos, parou um grande aeroporto para protestar contra a expansão da aviação, e os perigos do aquecimento global. Dois dias depois, o jornal The Guardian, publica matérias de página inteira mostrando a gravidade do momento na voz dos cientistas que estudam o tema: a situação é dramática e sem retorno! Coincidência? Pode ser, mas imaginar que os cientistas que estudam o ambiente se mobilizem para se acorrentarem às grades de um aeroporto pode ser um pouco demais… Mas, para esta turma que está ligada ao que acontece na sua cidade e no mundo, esse ativismo – que os adultos de hoje também faziam na sua esquecida juventude, principalmente os que estão agora no poder – é parte do seu jeito de ser. Para essa juventude que não se acomada aos bancos escolares, estas ações radicais podem ser a única saída e, quem sabe, esta não seja a única saída para todos nós.
Artigo publicado em A Tarde de 26/12/2008, pag. 03. Cópia da página em pdf.

Publicado também no Terra Magazine de 01.01.2009