A Tarde, 08/05/2007, página 03.
Nelson Pretto
Quanto alarde! A partir do anúncio do governo federal de um plano nacional para a educação no Brasil, a imprensa voltou a discutir exaustivamente a qualidade do ensino brasileiro, principalmente por conta da criação do novo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
A introdução desse novo índice, que articula diversos outros já existentes, possibilitará, é verdade, identificar as situações extremas de pouca qualidade da educação nos municípios, sendo um importante passo, mas, convenhamos, não o fundamental.
Afinal de contas, qual a novidade que esse índice nos apresenta? Nenhuma! Não é de hoje que conhecemos a triste realidade educacional do País e da nossa Bahia, que aparece com um dos piores resultados, possuindo sete entre os 20 municípios com pior ensino público de 1ª à 4ª sér ie.
Recentemente, foram divulgados os resultados de uma pesquisa realizada pelo Instituto Montenegro e a ONG Ação Educativa, repercutidos aqui em A TARDE, sobre o nível de alfabetização dos brasileiros, e estes já apontavam que a alfabetização integral só acontece no ensino médio, e assim mesmo apenas 56% dos que concluíram o ensino médio podem ser considerados conhecedores plenos das letras, e menos de 50% possuem habilidade plena com os números.
Contudo, nem mesmo desses dados precisaríamos. Converse com os que estão ao seu redor, alunos do ensino médio da maioria das escolas, tanto públicas como privadas, e você mesmo verá o tal Ideb baixíssimo, mesmo não sendo um especialista em estatística.
Nossa juventude não sabe ler e contar, mas não sabe também pensar sobre ciência, cultura, estética, política, ética (ah! isso nem se fala, entretanto convenhamos que este não é problema particular da juventude!).
Outra pesquisa, desta vez com dados do IBGE e do Inep, divulgada no início deste ano, aponta que do 1,7 milhão de jovens entre 15 e 17 anos que deveriam estar na escola, 40% não estavam porque acham “a escola chata”.
Faz-se muito alarde quando se constata uma realidade bem conhecida de todos nós, e bem pouco para a apresentação de soluções e projetos.
O lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação tem o mérito de tratar o conjunto do sistema educacional, da creche à pós-graduação, como um todo.
Mas, mesmo assim, precisamos olhar com mais atenção para essa problemática.
Nós, da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (Ufba), não temos dúvida: só se encaminha a resolução dos problemas estruturais da educação se tivermos coragem de afastar definitivamente a perspectiva mercadológica, onde tudo é comprado e vendido, com ênfase no sucesso e no consumo, emdetrimento de valores éticos, e a partir da qual a educação é reduzida a um processo fabril de transmissão de conhecimento, afastada das ciências e das culturas.
Também não temos dúvida de que é fundamental o fortalecimento do professor, não só com a garantia de um significativo piso salarial. Concomitantemente, faz-se imperioso resgatar a dignidade e autonomia dos professores, para que voltem eles a ser, efetivamente, produtores e estimuladores de culturas e de conhecimentos, e não meros repassadores de infor mações.
As escolas, por sua vez, precisam ser fortalecidas como espaços de criação, com forte envolvimento da comunidade, com fortalecimento do papel protagonista de crianças, jovens e adolescentes.
Os currículos precisam ser repensados, a formação dos professores, desde a inicial até a continuada, necessita do intenso envolvimento das instituições públicas de ensino superior, que precisam, de igual forma, ser fortalecidas.
E tudo isso não é novidade. De há muito, nós educadores insistimos nisso. A Bahia possui uma rede de instituições públicas espalhada pelo Estado que, se fortalecida, com recursos e infra-estrutura, pode estar articulada com os municípios na montagem e execução de um projeto revolucionário de formação de cidadania.
Esse não é apenas um papel do MEC ou da Secretaria de Educação, deveria, sim, ser uma ação estratégica do governo como um todo e em conjunto com a sociedade, que, com independência e autonomia, exerceria permanente o seu papel de fiscalizadora das ações dos governantes.