Tabuleiro Digital, 20 anos
Nelson Pretto – professor da Faculdade de Educação
da UFBA – nelson@pretto.pro.br
Há 20 anos, no dia 23 de janeiro de 2004, em uma cerimônia festiva no vão do primeiro andar da Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) lançávamos o projeto Tabuleiros Digitais, uma criação do nosso grupo de pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias (GEC), que oferecia para a comunidade UFBA e para a população do entorno da FACED, acesso livre e gratuito à internet, numa época que ainda a escrevíamos com o I maiúsculo. Queríamos contribuir com a diminuição da desigualdade digital que até hoje ainda é grave no país. Os dados apontam números dramáticos, pois, em 2022, 62% dos brasileiros acessavam a internet apenas pelo celular. Isso constitui-se um acesso precário, na maioria das vezes apenas associado às redes sociais proprietárias que são verdadeiros jardins murados, pois não possibilitam a plena fruição da navegação livre na rede.
À época, estávamos no início da implementação da internet no país e, aqui na Bahia, sob a liderança da UFBA na gestão de Felippe Serpa (1994-1997), estávamos executando, após uma histórica aprovação do Conselho Universitário, um amplo processo de informatização da Universidade com a simultânea coordenação de implantação da internet na Bahia. Essa ação envolvia o governo do estado (CADCT/SEPLANTEC), a prefeitura de Salvador, as Federações da Indústria, Agricultura e Comércio e muitos outros setores da sociedade baiana.
Os Tabuleiros Digitais nasceram inspirados na ancestral presença das baianas de acarajé, que com seus tabuleiros povoam as praças e os cantos de Salvador, constituindo-se em verdadeiros monumentos materiais e imateriais, servindo, ao mesmo tempo, como espaços de encontro que além de alimentar o corpo, possibilitam conversas que nos alimentam espiritualmente. Os Tabuleiros Digitais, com essa inspiração, constituíram-se em espaços de diálogos – e de conflitos! -, ocupando áreas antes vazias da nossa FACED. Aliás, caberia pensar se, hoje, não seria importante retomarmos projetos como esse como uma forma de povoar nossas Universidades, esvaziadas após a pandemia.
O móvel, criado para o projeto e executado pela oficina do Liceu de Artes e Ofícios – que crime a sua destruição! – apoiava terminais de computadores que rodavam exclusivamente com software livre (Linux) e possibilitavam a navegação livre, ou seja, não necessariamente pedagógica, viabilizando o uso pleno da internet. O projeto, inicialmente apoiado pela Petrobras, também foi
implantado em Irecê, de forma integrada ao Projeto Irecê, que ao longo dos anos contribuiu significativamente para a qualificação dos profissionais da educação do município.
Em 28/01/2004, aqui em A Tarde, uma manchete do antigo caderno Informática anunciava “No tabuleiro da baiana tem…” deixando para nós pensarmos o que mais poderia ter naqueles tabuleiros. Hoje celebramos, mesmo o projeto não mais existindo, dizendo no tabuleiro da baiana tem… tem muita coisa que merece ser celebrada, inclusive um tabuleiro digital.