Ao longo dos últimos anos, entidades da sociedade civil estiveram reunidas em uma forte articulação nacional no movimento Marco Civil Já. Foram anos de muita discussão para que o país pudesse ter uma Constituição para a internet que garantisse direitos e liberdades para o cidadão no uso da rede.
Depois de muita luta, o Marco Civil da Internet (MCI) foi aprovado (Lei 12965/14), trazendo garantias a direitos fundamentais para os usuários da rede, como a privacidade e a liberdade de expressão, em consonância com orientações internacionalmente aceitas de governança da internet. Nossa Lei foi saudada em todo o mundo. Estávamos garantindo que a internet continuasse como ela de fato nasceu: um espaço da liberdade e não um espaço aprisionado pelo modelo de negócios das operadoras de telecomunicações.
Mas as tentativas de mutilar essa Lei não pararam desde a sua aprovação.
Hoje teremos mais um capítulo desta novela, quando a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados votará o PL215/15, do Deputado Hildo Rocha (PMDB/MA) e seus apensos: PL1547/15 (Deputado Expedito Netto, SD/RO) e PL1589/2015 (Deputada Soraya Santos, PMDB/RJ).
O que se quer com tudo isso é criminalizar todas as ações na internet.
O movimento Marco Civil Já reagiu rápido e lançou uma carta pública denunciando esse jogo rasteiro no Congresso. Na carta, fica claro que, com as modificações propostas para o Código Penal, associado com a alteração proposta na Lei do MCI, o que se busca é “permitir que dados dos usuários sejam fornecidos a autoridades públicas independentemente de ordem judicial, assim como a obrigatoriedade de retirada de conteúdos postados na internet, nos casos de mera alegação de crimes contra a honra – calúnia, injúria e difamação –, impondo penalidades de restrição física e econômicas ao provedor de internet, comprometendo o princípio da inimputabilidade da rede. Entre os dados dos usuários que podem ser obtidos sem ordem judicial estão os conteúdos de comunicações na Internet: e-mails, mensagens e conversas no Skype e Whatsapp, por exemplo.”
Associo-me de forma contunde a todos que repudiam estas iniciativas parlamentares que atentem contra a privacidade e a liberdade de expressão. Não podemos aceitar que essa onda conservadora de vigilância, que cada dia ganha força no Congresso Nacional, destrua nossas mais recentes conquistas.
A carta enviada aos parlamentares foi direta: “O PL 215/15 coloca em risco o necessário equilíbrio entre a proteção do direito à privacidade e a persecução criminal, bem como a própria democracia ao permitir tais abusos.” É bom lembrar que “tais proposições já foram rejeitadas durante a tramitação do MCI. Aliás, vale destacar que os dispositivos hoje presentes no Marco Civil foram resultado de um amplo debate social e de uma intensa negociação política, o que torna esta uma das leis mais democráticas já votadas na recente história do Congresso Nacional.”
Não deixem que mutilem ainda mais o nosso Marco Civil da Internet.
Publicado em A Tarde de 22/09/2015, pag. 2
Replicado no Jornal da SBPC, aqui.