Livros didáticos: de novo?!
Nelson Pretto – professor da Faculdade de Educação da UFBA – www.pretto.info
Nós últimos dias, voltou à cena o tema dos livros didáticos.
Em 1988 escrevi:
“De tempo em tempo, a questão dos livros didáticos volta a ocupar as páginas dos jornais brasileiros. Um dos grandes problemas, sem dúvida, é o da quantidade de livros a serem distribuídos, mas esse não é o único e, quem sabe, nem o mais prioritário no momento. (…) A questão da qualidade do livro didático tem muito mais a ver com o livro do que com o didático propriamente dito. E, para que os livros sejam mais utilizados na escola, alguns questões centrais precisam ser atacadas. Três delas me parecem fundamentais. A primeira não exige muito esforço para ser demonstrada pois, certamente, olhando outras páginas deste mesmo jornal e de outros deste período, será fácil de constatar: trata-se da questão salarial.”
Este texto foi publicado há mais de 20 anos e republicado no meu livro “Escritos sobre Educação, Comunicação e Cultura”, editado pela Papirus em 2008. Ele foi escrito para o “Jornal do Professor do Primeiro Grau”, publicação que produzimos no INEP/MEC para ser distribuída a todos os professores das escolas públicas brasileiras, como forma de contribuir com a análise e o uso dos livros pelos professores. Naquele período, no INEP, estávamos tentando promover uma verdadeira cruzada para implementar políticas públicas para o Livro Didático que considerassem a complexidade do problema e a necessidade de um pleno fortalecimento dos professores, como única forma de tratar a questão. Minha ida para Brasília na década de 80 do século passado, se deu em razão do trabalho intenso que fizemos aqui na Bahia, quando promovemos, Instituto de Física, Faculdade de Educação da UFBA e as demais universidades estaduais, os “Encontros sobre o Livro Didático”, envolvendo mais de três mil professores em diversos municípios do Estado.
Pois agora, por conta do livro “Por uma vida melhor,” elaborado por uma equipe da histórica e atuante ONG Ação Educativa (http://www.acaoeducativa.org.br), a polêmica retorna pelo fato do referido livro apresentar alguns exemplos de linguagem popular usada nas conversas entre as pessoas. A Ação Educativa, em sua página na internet, publicou uma série de explicações, trazendo linguistas e outros acadêmicos para justificar o livro. Claro que isso é importante, porque mostra o espírito da obra mas, para mim, esse não é o ponto central.
Convenhamos, esse é um filme mais do que visto. Isso porque, não existe a possibilidade de um livro – ou qualquer outra forma de manifestação, pelo rádio, televisão, internet, outdoor – ser lido sem demandar de quem o leia uma capacidade de criticar o escrito, construindo a partir dele.
E para que isso ocorra nas escolas, já dizia ontem e direi sempre, precisamos de professores fortalecidos. Professores como intelectuais e ativistas, que tenham condições de comprar livros, tempo para lê-los e refletir sobre o lido. Isso demanda, em todos os níveis, professores com condições de trabalho e salários adequados. Também esse é um filme mais do que visto, principalmente por nós professores, que na verdade somos os pobres atores deste filme já muito reprisado. Mas entre esses atores, encontramos a professora Amanda Gurgel, autora de uma lúcida e forte fala em uma audiência pública para discutir a situação da educação no Rio Grande do Norte, realizada em Natal no último dia 10 de maio. O discurso da professora Amanda circula viralmente pela internet (http://youtu.be/yFkt0O7lceA) justo pelo que ele representa de forma mais contunde: a precária situação dos professores por esse Brasil a dentro.
Se a educação continuar a se constituir apenas em palavras fáceis e promessas de políticos e governantes e não for enfrentada como o grande desafio para a construção de uma Nação com N maiúsculo, ainda teremos muitos livros didáticos sendo utilizados como sendo portadores únicos de verdades inquestionáveis. No entanto, felizmente e cada vez mais, teremos professoras Amanda soltando o verbo em cada canto e escola deste país.
Publicado no jornal A Tarde de 18.5.2011, pag. 02