Arlindo Machado

Doutor em comunicações e professor de semiótica da PUC/SP e do departamento de Cinema, Rádio e Televisão da ECA/USPE. Seu campo de pesquisas abrange o universo das chamadas “imagens técnicas”, ou seja, daquelas imagens produzidas por meios de mediações tecnológicas diversas, tais como fotografia, cinema, o vídeo e as atuais mídias digitais e telemáticas.
Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural – Arte e Tecnologia.

Postado por Roseli Paraguassú – 24.10.08

Sobre Marcel Duphamp

Artista francês, Marcel Duchamp nasceu em Blainville, França, a 28 de julho de 1887, e morreu em Nova York, EUA, em 2 de outubro de 1968. Irmão do pintor Jacques Villon (Gastón Duchamp) e do escultor Raymond Duchamp-Villon. Freqüenta em Paris a Academie Julian, onde pinta quadros impressionistas, segundo ele, “só para ver como eles faziam isso”.
Em 1911-1912 suas obras “O rei e a rainha cercados de nus” e “Nu descendo uma escada” estão na confluência entre o Cubismo e o Futurismo. São quadros simultaneistas, análises do espaço e do movimento. Mas já se destacam pelos títulos, que Duchamp pretende incorporar ao espaço mental da obra.
Entre 1913-1915 elabora os “ready-made”, isto é, objetos encontrados já prontos, às vezes acrescentando detalhes, outras vezes atribuindo-lhes títulos arbitrários. O caso mais célebre é o de “Fonte”, urinol de louça enviado a uma exposição em Nova York e recusado pelo comitê de seleção. Os títulos são sugestivos ou irônicos, como “Um ruído secreto” ou “Farmácia”. Detalhe acrescentado em um “ready-made” célebre: uma reprodução da Gioconda, de Leonardo da Vinci, com barbicha e bigodes.
Segundo o crítico e historiador de arte Giulio Carlo Argan, os “‘ready-mades’ podem ser lidos como gesto gratuito, como ato de protesto dessacralizante contra o conceito ‘sacro’ da ‘obra de arte’, mas também como vontade de aceitar na esfera da arte qualquer objeto ‘finito’, desde que seja designado como ‘arte’ pelo artista”.
Esses “ready-mades” escondem, na verdade, uma crítica agressiva contra a noção comum de obra de arte. Com os títulos literários, Duchamp rebelou-se contra a “arte da retina”, cujos significados eram só, segundo ele, impressões visuais. Duchamp declarou preferir ser influenciado pelos escritores (Mallarmé, Laforgue, Raymond Roussel) – e não pretendia criar objetos belos ou interessantes. A crítica da obra de arte se estendia à antítese bom gosto-mau gosto.
Entre 1915 e 1923 o artista dedicou-se à sua obra principal, “O grande vidro”, pintura a óleo sobre uma placa de vidro duplo dividido em duas seções. A parte superior chamou de “A noiva desnudada pelos seus celibatários, mesmo”; e a inferior, “Moinho de chocolate”. Toda a obra é um pseudomaquinismo: a “noiva” é um aparato mecânico, assim como os “celibatários”. Contendo vários níveis de significação, várias hipóteses foram formuladas pela crítica para descobrir o sentido de sua complicada mitologia.
Para Giulio Carlo Argan, “O grande vidro” foi desenvolvido “em torno de significados erótico-místicos, joga com a transparência do espaço, com o significado alquímico e simbólico, com o conceito de ‘andrógino’, inato em todos os indivíduos”.

Coincidir arte e vida

Após “O grande vidro”, Duchamp dedicou-se aos mecanismos ópticos – que chamou de “rotorrelevos”. Em 1941 executa uma “caixa-maleta”, contendo modelos reduzidos de suas obras, e, em 1943, a “Caixa verde”, contendo fotos, desenhos, cálculos e notas.
A partir de 1957 vive em Nova York, dedicando-se à sua paixão pelo jogo de xadrez. Seu silêncio parece uma redução da capacidade inventiva, mas após sua morte descobre-se que o artista estivera trabalhando secretamente na construção de um “ambiente”: um quarto fechado onde repousa uma figura em cera, cercada de vegetações. O ambiente só pode ser visto, por determinação do artista, por um orifício da porta.
A obra de Duchamp, reduzidíssima, foi menos obra do que uma atitude, um gesto crítico radical, mas em muitas declarações o artista recusou-se a ser visto como um destruidor. A atitude crítica de Duchamp ainda repercute, tantos anos depois de suas criações radicais.
Na opinião de Giulio Carlo Argan, “talvez a obra de Duchamp alquímica por excelência seja toda a sua vida, que serve de modelo para todas as novas vanguardas do segundo pós-guerra, do ‘New Dada’ às experiências de recuperação do corpo como expressão artística, na intenção de fazer coincidir arte e vida”.
Fontes:
– Enciclopédia Mirador Internacional
– “Arte moderna”, Giulio Carlo Argan, Editora Cia. das Letras.
http://educacao.uol.com.br/biografias/Marcel-Duchamp.jhtm – 22/10/2008

Interatividade: conceitos

O que é Interatividade?
 O conceito de interatividade muitas vezes é confundido com o de interação, que embora estabeleça uma relação não comportam o mesmo significado. A palavra interatividade é encontrada no Dicionário Aurélio significando a “capacidade (de um equipamento, sistema de comunicação ou de computação, etc.) de interagir ou permitir interação”.
De acordo com Lemos (1997):
“…há uma diferenciação entre interatividade e interação. A primeira estaria relacionada ao contato interpessoal, enquanto a segunda seria mediada. A interatividade seria um tipo de comunicação encontrada não somente em um equipamento, mas também em sistemas que proporcionem interação ou um meio para consegui-la.”
A popularização da interatividade deve-se basicamente a expansão das novas tecnologias de comunicação que se faz presente no dia-a-dia das pessoas. Além de sua íntima ligação com a comunicação em ambiente digital, esta palavra é encontrada em outras áreas de conhecimentos com significados próprios inerentes a cada uma delas. Temos como exemplos:
– No campo da física, por exemplo na mecânica, podemos estudar a interatividade de forças, objetos e movimento.
– Já na filosofia, existem diversas abordagens sobre a interatividade entre a totalidade da experiência humana e da riqueza da natureza, vendo o homem como interagente constante e criativo.
– A biologia também explora a interatividade nas explicações genéticas.
– Na geografia vemos que as placas tectônicas, uma vez interagindo umas com as outras no interior da crosta terrestre, dobram-se formando montanhas e cadeias de montanhas.
Para Pierre Lévy (1999) o que caracteriza a interatividade é a possibilidade, crescente com a evolução dos dispositivos técnicos, de transformar os envolvidos na comunicação, simultaneamente, em emissores e receptores da mensagem.
Arlindo Machado (1990) também salienta a característica da bidirecionalidade do processo, onde o fluxo se dá em duas direções. O processo bidirecional de um meio de comunicação seria aquele onde “os pólos emissor e receptor são intercambiáveis e dialogam entre si durante a construção da mensagem”.
André Lemos (1997) entende que o que se compreende hoje por interatividade é nada mais que uma nova forma de interação técnica, de característica eletrônica. A interatividade digital seria um tipo de relação tecno-social, um diálogo entre homens e máquinas, em tempo real, localizadas em uma zona de contato, zonas de negociação, as interfaces gráficas. 
Link para texto Explorando o conceito de interatividade: definições e taxonomias de Alex Fernando Teixeira Primo e Márcio Borges Fortes Cassol.
http://usr.psico.ufrgs.br/~aprimo/pb/pgie.htm  
Referências:
PRIMO, Alex Fernando Teixeira; CASSOL, Márcio Borges Fortes. Explorando o conceito de interatividade: definições e taxonomias. 1999.
LEMOS, André L.M. “Anjos interativos e retribalização do mundo. Sobre interatividade e interfaces digitais”, 1997, [http://www.facom.ufba.br/pesq/cyber/lemos/ interac.html] 12/05/1999.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999. 264 p.
MACHADO, Arlindo. A arte do vídeo. São Paulo: Brasiliense, 1990.
[Postado em 23/10/2008 por Carmi Silva]

Éder Santos – Uma referência em videoarte no Brasil

Biografia

Eder José dos Santos Júnior
(Belo Horizonte MG 1960)
Santos é graduado em belas-artes e comunicação visual pela UFMG. Criou em Belo Horizonte a produtora Emvídeo, onde produziu a maior parte de sua obra. Seus vídeos integram hoje os acervos permanentes do MoMA, Nova York, e do Centre Georges Pompidou, Paris, e são distribuídos internacionalmente pela Electronic Arts Intermix (Nova York) e pela London Electronic Arts (Londres). Realizou diversas videoinstalações para eventos como Videobrasil (São Paulo) e ForumBHZVideo (Belo Horizonte). Trata-se de uma das obras videográficas mais densas e poéticas já produzidas no Brasil.

IMPORTÂNCIA DE SUA OBRA

Eder Santos talvez seja o mais conhecido e difundido dos atuais realizadores brasileiros de vídeo. Esse fato chega a ser surpreendente, porque talvez não exista atualmente no Brasil uma obra audiovisual mais difícil e desafiadora do que a dele. Entre as razões principais da dificuldade, podemos citar o fato de tais obras serem constituídas predominantemente de ruídos, interferências, “defeitos”, distúrbios do aparato técnico e, às vezes, roçam mesmo os limites da visualização. Em Enredando as Pessoas (1995), por exemplo, há uma referência metafórica a “civilizações controladas pelas imagens”, que se deixam invadir por elas, contaminar-se por elas, mobilizar-se por elas, como as religiões lograram concretizar até algum tempo atrás. Na direção contrária, uma obra como Janaúba (1993) mostra o ideal que Santos busca incansavelmente: recuperar a energia primordial das artes visuais, restabelecer o sentido e a força das imagens, que se teriam perdido no atual oceano de imagens industriais. Inspirado remotamente num filme antigo e mitológico do cinema mudo brasileiro (Limite, de Mário Peixoto), Janaúba é quase um retorno às origens do audiovisual, na tentativa de retomar valores que a civilização olvidou.
Na videoinstalação The Desert in My Mind (1992), outro exemplo instigante, os espectadores caminham sobre as imagens, com toda a carga semântica desmistificadora que pode existir no ato de pisar nas imagens. Não satisfeito com isso, Santos introduz ainda manchas de luz pulsantes sobre a superfície da tela, ruídos visuais simulando os arranhões característicos dos velhos filmes cinematográficos, compromete a estabilidade da imagem por meio de interferências sobre o sinal de controle vertical ou de uma câmera “tremida”, que lembra os exercícios ingênuos dos amadores. Embora tudo isso seja, na verdade, resultado de processamento da imagem em sofisticadas máquinas de efeitos digitais, o que se vê na tela não lembra nem de longe os produtos assépticos que normalmente se obtêm com tais recursos. Em alguns casos, Santos reprocessa inúmeras vezes uma mesma imagem para que, ao longo das sucessivas gerações de cópias, o sinal figurativo original obtido pela câmera entre em processo de degeneração. A verdade é que, pelo menos nos casos limítrofes, quase nada sobra para se ver, a não ser pálidos vestígios de imagens.
Nas três obras em que essa postura existencial está mais bem colocada – Não Vou à África Porque Tenho Plantão (1990), Essa Coisa Nervosa (1991) e Enredando as Pessoas (1995) -, uma interferência deliberada sobre o dispositivo técnico (wipes sucessivas e muito rápidas, simulando perda constante do sincronismo vertical dos frames) faz com que as imagens oscilem o tempo todo diante do olhar do espectador, tornando difícil – às vezes impossível – a visualização. Já em Poscatidevenum (1993), espetáculo multimídia concebido em conjunto com o músico Paulo Santos (do grupo Uakti) e para o qual Eder Santos criou as imagens projetadas e um vídeo de documentação (se é que se pode dizer isso de um vídeo de Santos), a imagem se reduz a puros grafismos nervosos, riscos e manchas destituídos de qualquer homologia com formas conhecidas do mundo visível. Nesse trabalho, como também em muitas das suas instalações mais recentes, Santos opera como um Pollock da era eletrônica, fazendo uma arte em que a imagem é mais um gesto iconizado do que o índice de alguma coisa reconhecível em termos de verossimilhança. Ademais, a indiferenciação técnica entre imagens videográficas e cinematográficas (eletrônicas e fotoquímicas) produz uma desconcertante variação de texturas plásticas, no lugar da convencional e reconfortante homogeneidade da imagem industrial a que estamos habituados. O resultado disso tudo é o envolvimento do espectador numa situação de desconforto visual que será fundamental para o seu enfrentamento da temática proposta.
Fonte:http://www.cibercultura.org.br/tikiwiki/tiki-index.php?page=Eder+Santos

Links para vídeos de artistas precursores do Videoarte – Post by Giltanei Amorim

Link para o vídeo Orbital Obsessions da artísta Steina, ano 1977 – Você poderá encontrar alguns trabalhos da artísta bem como outras referências de outros artistas visuais – http://www.fondation-langlois.org/html/e/media.php?NumObjet=12010
Link para o vídeo do Videoartista Coreano Nam June Paik, um dos mais conhecidos precursores do videoarte –http://br.youtube.com/watch?v=RkjxG_k0VDo
http://www.guggenheim.org/exhibitions/past_exhibitions/paik/paik_top.html
Site da Enciclopedia de Artes Visuais do Itaú Culturalhttp://www.itaucultural.org.br

– Postado por Giltanei Amorim

Videoarte        

Definição

O barateamento e a difusão do vídeo no final da década de 1960 incentivam os usos não-comerciais do meio por artistas do mundo todo, e sobretudo por aqueles que já experimentavam as imagens fotográficas e fílmicas.  A partir desse momento, o vídeo e a televisão entram em cheio no trabalho artístico, freqüentemente associados a outras mídias e linguagens. Os desenvolvimentos da arte pop, do Minimalismo e da Arte Conceitual tomam a cena dos anos 60 e 70, sobretudo nos Estados Unidos. Nesse momento, instalações, performances e happenings são amplamente realizados, sinalizando um certo espírito das novas orientações da arte: as tentativas de dirigir a criação artística às coisas do mundo, à natureza, à realidade urbana e ao mundo da tecnologia. Cada vez mais as obras articulam diferentes modalidades de arte – dança, música, pintura, teatro, escultura, literatura etc. -, desafiando as classificações habituais, colocando em questão o caráter das representações artísticas e a própria definição de arte.

A introdução do vídeo nesse universo traz novos elementos para o debate sobre o fazer artístico. As imagens projetadas ampliam as possibilidades de pensar a representação, além de transformarem as relações da obra de arte com o espaço físico, na esteira das contribuições minimalistas. A videoarte parte da idéia de espaço como campo perceptivo, defendida pelo minimalismo quando enfatiza o ponto de vista do observador como fundamental para a apreensão e produção da obra. Mas se o trabalho de arte na perspectiva minimalista é definido como o resultado de relações entre espaço, tempo, luz e campo de visão do observador, o uso do vídeo almeja  transformar de modo radical as coordenadas desse campo perceptivo, dando novo sentido ao espaço da galeria e às relações do observador com a obra. Colocado numa posição intermediária entre o espectador do cinema e o da galeria, o observador/ espectador da obra é convocado ao movimento e à participação. Uma nova forma de olhar está implicada nesse processo, distante da ilusão projetada pela tela cinematográfica e da observação da obra tal como costuma ocorrer numa exposição de arte. O campo de visão do espectador é alargado, transitando das imagens em movimento do vídeo ao espaço envolvente da galeria. As cenas, sons e cores que os vídeos produzem, menos do que confinados ao monitor, expandem-se de modo geral sobre e ao redor das paredes da galeria, conferindo ao espaço um sentido de atividade: o olho do espectador mira a tela e além dela, as paredes, relacionando as imagens que o envolvem. Se a videoarte interpela o espaço, visa também alterar as formas de apreensão do tempo na arte. As imagens, em série como num enredo ou projetadas simultaneamente, almejam multiplicar as possibilidades de o trabalho artístico lidar com as coordenadas temporais.

A videoarte deve ser lida na esteira das conquistas minimalistas, como dito, mas também da arte pop, pela sua recusa em separar arte e vida por meio da incorporação das histórias em quadrinhos, da publicidade, das imagens televisivas e do cinema. As performances e happenings largamente realizados pelos artistas ligados ao Fluxus, por sua vez, aparecem diretamente ligados à videoarte. As realizações Fluxus justapõem não apenas objetos mas também sons, movimentos e luzes num apelo simultâneo aos diversos sentidos: visão, olfato, audição, tato. Nelas, o espectador deve participar dos espetáculos experimentais, em geral, descontínuos, sem foco definido, não-verbais e sem seqüência previamente estabelecida. Ampliando o recuo temporal, é possível localizar ecos dadaístas, sobretudo dos trabalhos tridimensionais de Marcel Duchamp (1887-1968) – The Large Glass (1915-23) e To be looked at (from the other side of the glass) with one eye, close to, for almost na hour, conhecido como Small Glass (1918) – e de seus trabalhos óticos, Rotary glass plates (precision optics) (1924) e Anemic cinema (1926).

Impossível dar conta das inúmeras produções do gênero em todo o mundo e da variedade que marca as obras, definidas como videoinstalações, videoperformances, videoesculturas, videopoemas, videotextos etc. Em solo norte-americano, centro irradiador dessa modalidade artística, destacam-se os nomes de Vito Acconci (1940) – Undertime (1973), Air time (1973) e Command performance (1974), do músico e artista multimídia N. June Paik – TV garden (1974) e Magnet TV (1965), de Peter Campus (1937) – Shadow projection (1974) e Aen (1977), Joan Jonas (1936) – Funnel (1974) e Twilight (1975) e Ira Schneider (1939) – Bits, chuncks & prices – a  video album (1976). Artistas ligados ao minimalismo, como Robert Morris (1931), fizeram proveitoso uso de filmes e vídeos em seus trabalhos – Pharmacy (1962) e Finch College Project (1969). Os chamados pós-minimalistas, por sua vez, exploraram também as imagens, sobretudo o vídeo: Richard Serra (1939), Keith Sonnier (1941), Bruce Nauman, Robert Smithson (1938-1973) entre outros. O nome de Bill Viola (1951) deve ser lembrado como um importante expoente no campo das videoinstalações.

No Brasil, o desenvolvimento da videoarte remete à expansão das pesquisas no interior das artes plásticas e à utilização cada vez mais freqüente, a partir dos anos de 1960, de recursos audiovisuais por artistas como Antonio Dias (1944), Artur Barrio (1945), Iole de Freitas (1945), Lygia Pape (1927-2004), Rubens Gerchman (1942 – 2008), Agrippino de Paula, Arthur Omar (1948), Antonio Manuel (1947) e Hélio Oiticica (1937-1980). Apesar das controvérsias a respeito das origens da videarte entre nós, os estudos costumam apontar Antonio Dias como o primeiro artista a expor publicamente obras de videoarte (The illustration of Art – Music Piece, 1971). O uso do vídeo como meio de expressão estética por artistas brasileiros tem como marco a exposição de 1974 realizada na Filadélfia, quando expõem: Sônia Andrade, Fernando Cocchiarale, Anna Bella Geiger (1933), Ivens Machado (1942) e Antonio Dias. Na seqüência, outros artistas somam-se à geração primeira: Paulo Herkenhoff, Letícia Parente e Miriam Danowski. Em São Paulo, as experiências iniciais com a videoarte aparecem em 1976 em torno do MAC/USP, sob direção de Walter Zanini. Nesse contexto, destacam-se: Regina Silveira (1939), Julio Plaza (1938-2003), Carmela Gross (1946), Marcello Nitsche (1942), entre outros.

Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural – http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3854

Artista: Luigi Russolo

Luigi Russolo
Luigi Russolo nasceu na cidade de Portogruaro, Itália em 1885. Foi um pintor e um compositor italiano futurista. Morre em 1947 em Cerro. O maior contributo que deu ao futurismo foi no campo da música. Onde em 1913 publica o manifesto L´Arte dei Rumori (Arte de Ruídos). Inspirado na revolução industrial, no período pré-guerra, na era das máquinas e da velocidade, Russolo sente a necessidade de criar e mudar novos instrumentos musicais que dessem resposta aos anseios dos compositores, visto que, segundo ele, a revolução industrial deu ao homem a capacidade de apreciar sons mais complexos.
Para os futuristas era muito mais divertido e entusiasmante ouvir combinações de ruídos como os dos carros, dos carris, das máquinas, das multidões, dos motores a trabalhar. Por esse motivo, Russolo inventa novos instrumentos por ele denominados intonarumori com o intuito de transpor os ruídos do quotidiano para a música.

Ver toda a matéria}}} http://futurismo1909.wordpress.com/protagonistas/luigi-russolo-musico/

Manifesto – A Arte dos Ruídos
A Arte dos Ruídos (L’arte dei Rumori) é um manifesto futurista escrito em 1913 por Luigi Russolo numa carta ao seu amigo o compositor futurista Francesco Balilla Pratella. Pedra fundadora do movimento do ruído, é considerado como um dos textos mais importantes e mais influentes da estética musical do século XX, como afirma Robert Philippe ao seu propósito: “Um grande ruído elétrico formado por ondas da placa: aí está o que as bases do renascimento musical do vigésimo século em parte assemelharam-se” Russolo defende a idéia de que a orelha humana se familiarizou com a velocidade, a energia e o barulho do ambiente sonoro urbano e industrial, e que esta nova escala sonora necessita uma abordagem renovada dos instrumentos e da composição musical. Ele expõe diversas conclusões nas quais descreve a maneira como a eletrônica e outras tecnologias permitirão aos músicos futuristas de “substituir o número limitado de sons que possui a orquestra de hoje pela infinita variedade de sons contida nos barulhos, reproduzidos com a ajuda de mecanismos adequados”. A Evolução do somO ensaio de Russolo explora as origens dos sons criados pelo homem. “A vida antiga foi apenas de silêncio”
Russolo estabelece que o barulho só nasceu no século XIX, após a invenção das máquinas. Anteriormente, o mundo era um lugar calmo, silencioso. Tomamos como exceção as tempestades, as quedas d’ água e os sismos. O barulho que vinha interromper este silêncio não era nem intenso, nem prolongado, nem variado.
Intonarumori (entoador de ruídos)
São instrumentos mecânicos criados por Russolo capazes de traduzir uma realidade sonora que engloba toda uma gama de ruídos, além de obter sonoridades pouco usuais dos instrumentos de corda. Apesar de ainda não serem eléctricos, as invenções de Russolo contribuíram para um desenvolvimento do pensamento musical da era moderna, que só se concretizaria posteriormente com o auxílio da electricidade e o gravador de fita.
Russolo (a esquerda da foto) com algumas de suas criações.
intonarumori
Futurismo 
O Futurismo é um movimento artístico e literário, que surgiu oficialmente em 20 de fevereiro de 1909 com a publicação do Manifesto Futurista, pelo poeta italiano Felippo Marinetti, no jornal francês Le Figaro. Os adeptos do movimento rejeitavam o moralismo e o passado, e suas obras baseavam-se fortemente na velocidade e no desenvolvimento tecnológico do final do século XIX. Os primeiros futuristas europeus também exaltavam a guerra e a violência. O Futurismo desenvolveu-se em todas as artes e influenciou diversos artistas que depois fundaram outros movimentos modernistas.
Futurismo no Brasil
O futurismo influenciou diversos artistas que depois fundaram outros movimentos modernistas, como Oswald de Andrade e Anita Malfatti, eles tiveram contacto com o Manifesto Futurista com Marinetti em viagens à Europa já em 1912. Após uma interrupção forçada pela Grande Guerra, o contato foi retomado. Foi certamente uma das influências da Semana de Arte Moderna de 1922, e seus conceitos de desprezo ao passado para criar o futuro e não à cópia e veneração pela originalidade caiu como uma luva no desejo dos jovens artistas de parar de copiar os modelos europeus e criar uma arte brasileira. Oswald , principalmente, apercebeu-se que o Brasil e toda a sua multiplicidade cultural, desde as variadas culturas autóctones dos índios até à cultura negra, representavam uma vantagem e que com elas se podia construir uma identidade e renovar as letras e as artes.
Manifesto do Futurismo
“Le Figaro”

1. Nós pretendemos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e a intrepidez.
2. Coragem, audácia, e revolta serão elementos essenciais da nossa poesia.
3. Desde então a literatura exaltou uma imobilidade pesarosa, êxtase e sono. Nós pretendemos exaltar a acção agressiva, uma insónia febril, o progresso do corredor, o salto mortal, o soco e a bofetada.
4. Nós afirmamos que a magnificiência do mundo foi enriquecida por uma nova beleza: a beleza da velocidade. Um carro de corrida cuja capota é adornada com grandes canos, como serpentes de respirações explosivas de um carro bravejante que parece correr na metralha é mais bonito do que a Vitória da Samotrácia.
5. Nós queremos cantar hinos ao homem e à roda, que arremessa a lança de seu espírito sobre a Terra, ao longo de sua órbita
6. O poeta deve esgotar a si mesmo com ardor, esplendor, e generosidade, para expandir o fervor entusiástico dos elementos primordiais.
7. Excepto na luta, não há beleza. Nenhum trabalho sem um carácter agressivo pode ser uma obra de arte. Poesia deve ser concebida como um ataque violento em forças desconhecidas, para reduzir e serem prostradas perante o homem.
Ver todo o manifesto}}} http://futurismo1909.wordpress.com/manifesto/
 Pintura de Russolo
Russolo Pintura
[Postado em 19/10/2008 por Carmi Silva]

Videoarte e vídeo instalação – Postado por: Aldren Lincoln

CONCEITO

O vídeo chegou relativamente cedo ao Brasil e muito rapidamente se tornou um dos principais meios de expressão das gerações que despontaram na segunda metade do século XX. Já no fim da década de 60, apenas dois ou três anos após seu lançamento comercial no exterior, os primeiros modelos portáteis de videoteipe começaram a aparecer no Brasil. Esse equipamento havia sido colocado no mercado pela indústria eletrônica japonesa para uso privado nas empresas, com vista ao treinamento de funcionários, mas nada pôde impedir que, em determinadas circunstâncias, as expectativas industriais fossem superadas. A simples disponibilidade desse equipamento abriu espaço para o surgimento daquilo que René Berger chamou de microtelevisão, uma televisão radical, produzida e difundida em circuito fechado, independente dos modelos econômicos e culturais da televisão broadcasting convencional.

PRIMEIRA GERAÇÃO: OS PIONEIROS

O primeiro brasileiro a mostrar publicamente obras de videoarte foi possivelmente Antônio Dias, mas isso aconteceu no contexto italiano, onde ele vivia. Entre os críticos, há um consenso de que o vídeo, encarado como um meio para a expressão estética, surge oficialmente no Brasil em 1974, quando uma primeira geração de artistas, convidada para participar de uma mostra de videoarte na cidade norte-americana de Filadélfia, realizou aqui os primeiros videoteipes, parte dos quais sobrevive até hoje. Embora o convite tivesse sido extensivo a artistas brasileiros em geral, na época apenas os cariocas conseguiram viabilizar a produção, graças à intermediação de Jom Tob Azulay, que acabara de trazer um equipamento portapack dos Estados Unidos e o colocou à disposição de alguns artistas do Rio de Janeiro (Sônia Andrade, Fernando Cocchiarale, Anna Bella Geiger e Ivens Machado). A esse grupo somou-se ainda Antônio Dias, que produziu com os meios que conseguiu levantar em Milão. Logo a seguir, outros artistas vieram engrossar a primeira geração de realizadores: Paulo Herkenhoff, Letícia Parente e Míriam Danowski, todos ainda ligados ao contexto carioca. Em São Paulo, os primeiros trabalhos começam a aparecer em 1976, quando o MAC/USP, dirigido por um entusiasta da videoarte (Walter Zanini), adquire um equipamento portapack e o disponibiliza aos artistas da cidade. Regina Silveira, Julio Plaza, Carmela Gross, Donato Ferrari, Gabriel Borba, Marcelo Nitsche e Gastão de Magalhães são os primeiros a experimentar essa nova tecnologia em São Paulo, mas é preciso considerar também o caso isolado de José Roberto Aguilar, que trouxe do Japão o seu próprio equipamento. Fora do eixo Rio-São Paulo temos ainda o caso de Paulo Bruscky, que produziu alguns trabalhos no Recife, na virada dos anos 70/80.
Eles eram, na sua maioria, artistas plásticos preocupados com a busca de novos suportes para a produção. Como se sabe, a partir de meados da década de 60, muitos artistas tentaram romper com os esquemas estéticos e mercadológicos da pintura de cavalete, buscando materiais mais dinâmicos para dar forma às suas idéias plásticas. Alguns saíram para as ruas e produziram intervenções na paisagem urbana. Outros passaram a utilizar o próprio corpo como suporte artístico e converteram suas obras em performances no espaço público. Outros ainda procuraram mesclar os meios e relativizar as fronteiras entre as artes, produzindo objetos e espetáculos híbridos como as instalações e os happenings. E houve também aqueles que foram buscar materiais para experiências estéticas inovadoras nas tecnologias geradoras de imagens industriais, como é o caso da fotografia, do cinema e sobretudo do vídeo. Nos anos 70, Hélio Oiticica introduziu a idéia fertilíssima do quase-cinema, para designar um campo de experiências transgressivas dentro do universo das mídias ou das imagens e sons produzidos tecnicamente. Num certo sentido, é impossível compreender a primeira videoarte fora desse movimento de expansão das artes plásticas ou de reapropriação dos processos industriais, que já havia antes acumulado experiências no terreno do audiovisual (projeção de diapositivos) e do cinema de 16 mm ou super-8 (Antônio Dias, Barrio, Iole de Freitas, Lygia Pape, Rubens Gerchman, Agrippino de Paula, Arthur Omar, Antônio Manuel e o próprio Oiticica).
De qualquer maneira, toda a primeira geração brasileira de criadores de vídeo era constituída de nomes em geral já consagrados no universo das artes plásticas ou em processo de consagração, como foram os casos de Antônio Dias, Anna Bella Geiger, José Roberto Aguilar, Ivens Machado, Letícia Parente, Sônia Andrade, Regina Silveira, Julio Plaza, Paulo Herkenhoff, Regina Vater, Fernando Cocchiarale, Mary Dritschel, Ângelo de Aquino, Míriam Danowski, Paulo Bruscky e tantos outros. O vídeo nasceu, portanto, integrado ao projeto de expansão das artes plásticas, como um meio entre outros, mas no processo criativo do artista ele nunca chegou a ser encarado com exclusividade.
A maioria dos trabalhos produzidos por essa primeira geração de realizadores de vídeo consistia fundamentalmente no registro do gesto performático do artista. O dispositivo básico do primeiro vídeo brasileiro consistia, portanto, quase que exclusivamente no confronto da câmera com o artista.
Um pouco depois da experiência carioca e da experiência paulistana do MAC/USP, mais exatamente a partir de 1977, Roberto Sandoval, retomando o elo com a videoarte internacional, despontaria como o primeiro videoartista brasileiro a explorar imagens inteiramente abstratas (na série Segmentos, produzida entre 1979 e 1981), ao mesmo tempo que a sua escola de arte em São Paulo (a Aster) e logo depois a sua produtora de vídeo (a Cockpit) se converteriam nos principais pólos de aglutinação e de suporte instrumental para toda uma geração de videoartistas paulistanos. Justamente por dispor de recursos próprios e mais sofisticados do ponto de vista tecnológico, Sandoval acumulou um repertório de teipes e cassetes dos mais amplos. E o fato de dispor de uma ilha de edição permitiu-lhe desenvolver uma técnica de montagem acelerada, com planos brevíssimos cortados em ritmo sincopado, técnica essa que acabou por identificar o seu estilo particular. Desgraçadamente, porém, toda a obra de Sandoval e de grande parte dos outros artistas de seu círculo de influências desapareceu numa das catastróficas enchentes da cidade, que inundou a produtora Cockpit, onde estava depositada. Do grupo ligado a Sandoval, Regina Silveira foi a que produziu um dos trabalhos mais originais.
Da primeira geração de realizadores, a maioria logo desistiu do vídeo e partiu para outras experiências plásticas. Poucos foram os que se mantiveram fiéis aos seus princípios básicos e continuaram a sua tradição ao longo das décadas seguintes. Entre aqueles que deram continuidade ao projeto estético dos pioneiros (simplicidade formal, uso moderado de tecnologia, inserção “narcísica” do próprio realizador na imagem, auto-exposição pública), o nome mais importante foi, sem dúvida, o de Rafael França. Como acontecia em quase toda a obra da primeira geração, o personagem principal dos vídeos de França é quase sempre ele mesmo, seja figurando pessoalmente como protagonista, seja se fazendo projetar num outro. França encontrou no vídeo um meio adequado para meditar e especular sobre seus próprios conflitos interiores, sobretudo sobre sua obsessão maior: a fatalidade da morte. Sua obra, de cunho bastante pessoal, esteve também centrada numa indagação dramática sobre a questão da homossexualidade.
No período de transição do vídeo brasileiro, deve-se citar ainda a intervenção diferenciada de Artur Matuck, que, como Rafael França, desenvolveu parte de sua obra nos Estados Unidos. Ao todo, o trabalho de Matuck compreende pouco mais de uma dezena de vídeos, dos quais uma parte significativa tem inspiração ecológica.

SEGUNDA GERAÇÃO: O VÍDEO INDEPENDENTE

No começo dos anos 80, uma nova vaga de realizadores viria reorientar a trajetória do vídeo brasileiro. Trata-se da geração do vídeo independente, constituída em geral de jovens recém-saídos das universidades, que buscavam explorar as possibilidades da televisão enquanto sistema expressivo e transformar a imagem eletrônica num fato da cultura de nosso tempo. O horizonte dessa geração é agora a televisão e não mais o circuito sofisticado dos museus e galeriais de arte. Muito sintomaticamente, essa outra vaga se opõe à videoarte dos pioneiros pela tendência ao documentário e à temática social. Com sua entrada barulhenta em cena, o vídeo começa a sair do gueto especializado e conquista seu primeiro público. Surgem os festivais de vídeo, dos quais os mais importantes foram o Videobrasil (São Paulo) e o FórumBHZVídeo (Belo Horizonte), aparecem timidamente as primeiras salas de exibição e começam a se esboçar estratégias para romper o feudo das redes comerciais de televisão.
Mas essa televisão ousada e criativa, que trazia à luz temas muitas vezes incômodos, permaneceu, durante muito tempo, ausente da televisão propriamente dita. Esta última ignorou sistematicamente a produção independente, essa produção que, paradoxalmente, se prestava de forma perfeita à tela pequena, utilizava com adequação o tempo televisual e usava criativamente os recursos eletrônicos de estúdio. As possibilidades criativas da televisão só puderam, portanto, ser exploradas fora da televisão, em circuitos (fechados) alternativos. Mas a marginalização do vídeo independente lhe dava maior intensidade. Menos comprometido com a centralização de interesses e com o alto custo do capital verificáveis no modelo broadcasting de televisão, o vídeo independente, produzido e difundido fora dos circuitos oficiais, podia investir no aprofundamento da função cultural da televisão, avançando na experimentação das possibilidades da linguagem eletrônica, dando ressonância aos graves problemas sociais do país e buscando exprimir as inquietações mais agudas do homem de nosso tempo. Ele podia executar, portanto, uma função cultural de vanguarda, no sentido produtivo do termo: ampliar os horizontes, explorar novos caminhos, experimentar outras possibilidades de utilização, reverter a relação de autoridade entre produtor e consumidor, de modo a forçar um progresso da instituição convencional da televisão, demasiado inibida pelo peso dos interesses que são nela colocados em jogo.
Se fosse possível contar todos os grupos e talentos individuais que surgiram na onda do vídeo independente é provável que eles somassem por volta de uma centena. Uma vez que seria impossível tratar isoladamente da experiência de todos esses grupos, vamos nos deter no exame das experiências que se revelaram mais férteis e que tiveram maior número de seguidores. A primeira é a de um grupo estreitamente ligado aos meios vanguardísticos da cidade de São Paulo e que despontou, no início dos anos 80, com propostas renovadoras de indiscutível impacto. Conhecido pelo nome inventivo de TVDO (lê-se “TV Tudo”), esse grupo (constituído pelos videomakers Tadeu Jungle, Walter Silveira, Ney Marcondes, Paulo Priolli e Pedro Vieira) talvez tenha sido a melhor tradução para a mídia eletrônica do espírito demolidor e anárquico do cinema de Glauber Rocha. TVDO é também responsável pelas experiências mais radicais do ponto de vista da invenção formal e da renovação dos recursos expressivos do vídeo. Nesse sentido, seus trabalhos se aproximam estreitamente de atitudes e procedimentos da videoarte dos pioneiros e são muitas vezes confundidos e consumidos como tal. No entanto, a familiaridade do grupo com a televisão e com as formas em geral da cultura de massa, a sua resoluta decisão de operar na fronteira entre a cultura popular e a erudita, como também a sua vontade de intervir criticamente na realidade do país, tudo isso acaba contribuindo para tornar mais “acessíveis” e generalizáveis suas conquistas formais e temáticas, que se dão na vanguarda da invenção estética, sem incorrer todavia em diluição.
Um outro grupo importante no movimento dos independentes é o Olhar Eletrônico (cuja configuração foi variável ao longo do tempo, mas o seu núcleo central era constituído basicamente por Marcelo Machado, Fernando Meirelles, Renato Barbieri, Paulo Morelli e Marcelo Tas). Tal como TVDO, foi um dos grupos que mais ajudaram a sacudir o bolor da mídia eletrônica, experimentando soluções arrojadas e jamais antes encontradas na rotina televisual. O Olhar começou realizando vídeos brevíssimos, de três ou quatro minutos de duração, nos quais experimentava uma linguagem de extrema concentração e explorava de forma inventiva aquilo que os americanos chamam de machine-gun cut (corte-metralhadora). Na verdade, a técnica da montagem acelerada, com planos bastante breves e cortados em ritmos sincopados, havia sido introduzida no Brasil por um pioneiro da videoarte, Roberto Sandoval; o que fez o Olhar foi dar-lhe conseqüência como forma poética. Numa outra linha de experimentação, o Olhar buscou também quebrar os modelos de representação que nos são impostos sutilmente por meio dos aparatos de codificação (câmeras, ilhas de edição) e pelos canais de difusão.

TERCEIRA GERAÇÃO: O VÍDEO DE CRIAÇÃO

A terceira geração de videomakers brasileiros não representa propriamente uma virada radical de estilo, forma e conteúdo em relação às outras duas fases já vividas pelo vídeo. Na verdade, essa nova geração, que desponta publicamente nos anos 90, tira proveito de toda a experiência acumulada, faz a síntese das outras duas gerações e parte para um trabalho mais maduro, de solidificação das conquistas anteriores. A maioria dos representantes dessa nova geração vem do ciclo do vídeo independente. Muitos tomaram parte do movimento e integraram grupos no período, preferindo optar, a partir dos 90, por um trabalho mais pessoal, mais autoral, menos militante ou socialmente engajado, retomando portanto certas diretrizes da geração dos pioneiros. Percebe-se também nesta terceira geração um certo afrouxamento das preocupações locais, a fixação em temáticas de interesse universal e um vínculo mais direto com a produção videográfica internacional.
Eder Santos talvez seja o mais conhecido e difundido dos atuais realizadores brasileiros de vídeo. Esse fato chega a ser surpreendente, porque talvez não exista atualmente no Brasil uma obra audiovisual mais difícil e desafiadora do que a de Santos. Na verdade, pode-se caracterizar os vídeos desse realizador mineiro como as experiências mais radicais e mais isentas de concessões de toda a produção videográfica brasileira. Entre as razões principais da dificuldade, podemos citar o fato de tais obras serem constituídas predominantemente de ruídos, interferências, “defeitos”, distúrbios do aparato técnico e, às vezes, roçam mesmo os limites da visualização. Em muitas de suas videoinstalações, Santos faz projetar imagens de vídeo sobre paredes texturizadas e rugosas, ou ainda sobre dunas de areia ou chão irregular, de modo a perturbar a inteligibilidade das imagens ou corromper a sua coerência figurativa.
Compreende-se bem essa fúria desconstrutiva com relação ao audiovisual: Santos ataca em seus vídeos justamente a perda de vitalidade das imagens, sua redução a clichês gastos pelo abuso da repetição e, nessa investida contra a atual degeneração das imagens, ele se mostra implacável como poucos. A trivialidade da vida cotidiana, o comportamento estereotipado, o turismo de massa e a futilidade dos cartões-postais são materiais de que o realizador lança mão para construir contra eles, mas a partir deles, uma reflexão implacável sobre a civilização contemporânea. Há em toda a obra de Santos uma tendência inequívoca de contrapor-se à atual promiscuidade das imagens, de lançar fogo contra um certo tratamento de superfície que predomina na atual vaga do audiovisual e de praticar, ao mesmo tempo, uma espécie de ecologia do olhar. Embora a televisão não esteja explicitamente nomeada nas obras, ela é sem dúvida o alvo principal da investida desses vídeos e filmes. É com a televisão e seu fluxo de imagens na maior parte das vezes promíscuas que Santos polemiza o tempo todo, e é na televisão que ele quer, no mesmo ímpeto, retomar uma certa energia primordial, sufocada pelo tráfico de lixo comercial.
Outra é a perspectiva do trabalho de Sandra Kogut, que parece concentrar e exprimir as tendências mais decisivamente inovadoras da arte do vídeo, ao mesmo tempo que radicaliza o processo iniciado por Nam June Paik de eletrificação da imagem e de desintegração de toda e qualquer unidade ou homogeneidade discursiva. A técnica da escritura múltipla que marca esse trabalho, em que texto, vozes, ruídos e imagens simultâneas se combinam e se entrechocam para compor um tecido de rara complexidade, constitui a própria evidência estrutural daquilo que modernamente convecionamos chamar de uma estética da saturação, do excesso (a máxima concentração de informação num mínimo de espaço-tempo) e também da instabilidade (ausência quase absoluta de qualquer integridade estrutural ou de qualquer sistematização temática ou estilística). Se for possível reduzir a uma palavra o projeto estético que está pressuposto na obra videográfica de Sandra Kogut, podemos dizer que se trata de uma procura sem tréguas dessa multiplicidade que exprime o modo de conhecimento do homem contemporâneo. O mundo é visto e representado como uma trama de relações de uma complexidade inextricável, em que cada instante está marcado pela presença simultânea de elementos os mais heterogêneos, e tudo isso ocorre num movimento vertiginoso, que torna mutantes e escorregadios todos os eventos, todos os contextos, todas as operações.
A força do trabalho de Sandra Kogut, todavia, nem sempre tem sido notada com a devida ênfase. A predominância de leituras de tendência antropológica, viabilizadas sobretudo como decorrência do projeto das videocabines, que notabilizou a realizadora no plano internacional, tem obscurecido um pouco a percepção de seu verdadeiro alcance. Basta ver um minuto de qualquer trabalho de Kogut para se perceber que a realizadora não se restringe apenas à celebração de um referente interessante ou pitoresco. É no trabalho de articulação dessas intervenções, no comentário astucioso do que é dito e do que é calado, na forma com que as falas são jogadas umas contra (ou a favor de) as outras, na maneira enfim com que tudo acaba sendo de alguma forma ironizado que está o traço mais importante da produção autoral de Kogut. Há uma distância brutal entre os aspectos pitorescos da intervenção popular nas videocabines e o fulminante resultado obtido após os trabalhos de montagem e finalização, com destaque à utilização maciça de recursos computadorizados de pós-produção.
Outros dois nomes importantes no contexto da terceira geração de realizadores brasileiros são Walter Silveira e Arnaldo Antunes. Coincidentemente, os dois foram originalmente poetas e emergiram do movimento da poesia concreta. Esse movimento, que produziu sobre a cultura brasileira um impacto tão grande quanto a bossa nova na música e o cinema novo no cinema, procurou experimentar uma poesia de feição radicalmente contemporânea, com grande ênfase dedicada aos aspectos mais propriamente visuais e sonoros do poema. A poesia de Silveira, por exemplo, deve grande parte do seu impacto aos aspectos gráficos da escrita, ao uso expressivo das cores e à tipologia de suas letras manuscritas, exigindo muitas vezes do leitor um trabalho de “decifração” prévia dos caracteres. No campo do vídeo, Silveira optou por experiências limítrofes com a linguagem da mídia eletrônica, de que VT Preparado AC/JC (1986, realizado em parceria com Pedro Vieira) constitui o melhor exemplo.
Por sua vez, Arnaldo Antunes é um nome bem mais conhecido no Brasil como pop star, uma vez que foi líder de uma das mais famosas bandas brasileiras de rock: os Titãs. Nos últimos anos, entretanto, após romper com a banda, ele tem-se voltado a uma antiga paixão: a poesia. De fato, tal como Silveira, Antunes tem sido um dos poetas mais talentosos da geração emergida do movimento da poesia concreta, tendo inclusive publicado cinco antologias poéticas de sua autoria. Depois de 1992, ele muda o curso de sua poesia e começa a experimentar uma nova forma de literatura, uma literatura feita no computador e destinada a ser lida na tela do aparelho de televisão. Utilizando recursos de computação gráfica e de vídeo, ele lança, em 1993, uma seleção de trinta impressionantes videopoemas (Nome), que combinam letras animadas com cores mutantes, imagens tomadas por câmeras de vídeo, oralização e música. Tal como o Parabolic People de Kogut, é mais um passo na direção de uma arte multimídia, capaz de combinar todas as artes anteriores numa síntese perfeita.
Ainda entre os realizadores da terceira geração, deve-se destacar também o nome de Lucila Meirelles, que já fora antes colaboradora de Aguilar, nos idos dos anos 70, e depois se converteu numa das mais ativas divulgadoras e produtoras de eventos relacionados com a história da videoarte brasileira. O trabalho criativo de Meirelles é sui generis e não tem similares em nossa videografia. Antes de mais nada, trata-se de uma pesquisa de transferência do olhar, na tentativa de experimentar um outro ponto de vista sobre o mundo, um ponto de vista “interno” a certos grupos humanos “atípicos”, como o das crianças autistas (Crianças Autistas, 1989), ou das crianças transgressoras e confinadas em prisões disfarçadas de internatos (Pivete, 1987), ou ainda dos sertanejos cegos pela luz do sertão (Histórias Luminosas do Sertão, 1997). Meirelles busca não exatamente construir um discurso sociológico ou antropológico sobre o outro, mas criar alguns dispositivos semióticos que nos permitam, sob certas condições, “assumir” o ponto de vista (e o ponto de audição) do focalizado, situando-nos em “seu” mundo. Tarefa difícil, sem dúvida, e que Meirelles conduz sem nenhuma ingenuidade, conhecendo bem todas as ciladas, mas cujos desafios ela tem enfrentado com uma eloqüência e com uma dignidade que encontra poucos similares na arte brasileira mais recente. Kiko Goifman é outro videomaker que poderíamos destacar entre aqueles que também produzem trabalhos voltados para as questões da antropologia visual.
Mas a grande surpresa da virada dos 80 para os 90, porém, foi a adesão ao vídeo de três importantes nomes do cinema experimental: Andrea Tonacci, Júlio Bressane e Arthur Omar. Na verdade, a incorporação da eletrônica pelo cinema é um fenômeno que começa a acontecer de forma gradativa a partir dos anos 80 em todo o mundo e na maioria dos casos para dar respostas a determinados problemas insuperáveis dentro da especificidade da cinematografia stricto sensu. Aos poucos, enfrentando a desconfiança geral, alguns cineastas mais ousados e inquietos começam a mesclar as tecnologias. Eles partem do pressuposto de que o equipamento disponível e os métodos de trabalho acabam por submeter as idéias criativas a normas de todas as espécies (estéticas, profissionais, institucionais), de modo que, às vezes, é preciso recorrer a um instrumental ainda não inteiramente afetado pelos hábitos para poder descobrir novas possibilidades e uma outra maneira de produzir algo diverso. Dos três cineastas citados, aquele que manteve uma produção de vídeo mais sistemática foi Arthur Omar. A produção videográfica de Omar é já bastante vasta e inclui tanto vídeos single channel como instalações para vários monitores, sempre todos muito fortes no tocante ao impacto sensorial.
Novos nomes despontam lentamente, com uma obra por enquanto pequena na quantidade mas já grande na qualidade. No que diz respeito à novíssima geração, é impossível deixar de mencionar vários nomes: Carlos Nader, Lucas Bambozzi, Kiko Goifman e Adriana Varella. Carlos Nader surpreendeu com uma obra de impacto como O Beijoqueiro (1992). Trata-se de um retrato implacável da loucura brasileira, por meio da perspectiva individual de um psicopata que se converteu em herói nacional. Nader tem se destacado dentro da novíssima geração de realizadores pela busca de novos formatos videográficos ou de novas estruturas narrativas, menos comprometidas com as práticas já cristalizadas no cinema ou na televisão.
No caso de Lucas Bambozzi, salta à vista, em primeiro lugar, uma sensibilidade muito particular para lidar com as imagens eletrônicas. Essas imagens estão sempre a um passo da liquefação ou da dissolução, o que lhes dá um aspecto de imprecisão fundamental para sustentação das temáticas propostas. Assim, ora elas aparecem granuladas, mascaradas, desfocadas ou distorcidas, ora tremulam instáveis diante do espectador, ora ainda as suas referências figurativas se apagam, resultando apenas um grafismo nervoso ou manchas indistintas na tela. Ao mesmo tempo, um trabalho de edição muito preciso permite controlar o tempo de duração de cada plano, de tal forma que a visualização é interrompida antes que a imagem se torne inteiramente perceptível ao espectador, resultando desse procedimento uma evocação vaga, uma sugestão quase inconsciente, em lugar da figura consistente que habitualmente se encontra nos produtos audiovisuais de finalidades industriais.
Cabe ressaltar que videoinstalações aconteceram com maior ênfase na última geração e vários dos artistas citados dedicaram grande parte de sua produção à criação dessa classe de trabalhos, como, por exemplo, Eder Santos e Lucas Bambozzi. Mas há ainda aqueles que só fizeram videoinstalações, como é o caso de Adriana Varella.

 

Disponível em: http://www.cibercultura.org.br/tikiwiki/tiki-index.php?page=videoarte%20e%20v%C3%ADdeo%20instala%C3%A7%C3%A3o

 

sobre o admirável

O Belo, o Admirável, suas Estéticas e um Impeachment
Alexandre Rocha da Silva 1
Que lugar ocupam fatos, manifestações, experiências, os sentidos da vida, suas potências, cujas sensações e até mesmo características assemelham-se às sensações e às características próprias da fruição artística? O que há de comum entre o surrealismo de Dali ou Buñuel, o teatro de Beckett, um filme de Grennway, a palavra de Clarice, a voz de Elis, um culto de transubstanciação, um ritual de candomblé, a superação da AIDS, o movimento pacifista, os cara-pintadas e o impeachment de Collor?
Em conjunto, tais manifestações apontam para o que Charles Sanders Peirce denominou admirável, ou seja, para o que não pode ser negado, para a qualidade enquanto tal, em sua pureza, primeiridade capaz de orientar a ação da ética e as determinações lógicas. Caberia à estética o estudo desse admirável na busca da razoabilidade concreta, segundo o filósofo norte-americano que sempre desconfiou do vínculo estrito e exclusivo entre a estética como disciplina e o belo como objeto de estudo. Para ele, este exclusivismo, que, como todos os exclusivismos, gera fanatismos e distorções irracionais, obliterou a possibilidade de compreensão da estética como uma ciência puramente teórica na qual “o fenômeno é examinado à luz de nossa habilidade de interagir com ele”2.
Isso não significa que Peirce não reconhecesse um lugar privilegiado para as obras de arte. Essas, muitas vezes, constituem o admirável em essência, como um fora que, por sua condição de pura qualidade, redireciona ações éticas e ordena a própria lógica. A obra de arte como acontecimento escapa dos exclusivismos e nega os exageros: ela é o tipo de signo que mais harmoniosamente mistura as três categorias fenomenológicas peirceanas. Peirce dizia que se trata “da impressão total inanalisável de uma razoabilidade que se expressou numa criação. É um puro Sentimento, mas é um sentimento que é a impressão de uma Razoabilidade que Cria. É uma Primeiridade que realmente pertence à Terceiridade na sua realização da Secundidade (MS 310: 9).” 3

___para continuar a ler este texto >>> http://redebonja.cbj.g12.br/ielusc/necom/rastros/rastros04/rastros0407.html

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postado por [ana pi] 17-10-08

sobre a arte da telepresença _ TELE-PRESENÇA-AUSÊNCIA

 Telegarden _ Ken Goldberg Telegarden, Ken Goldeberg. 1995.   
 versus.JPG Versus, Ivani Santana. 2005.
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TELE-PRESENÇA-AUSÊNCIA
Carlos Fadon Vicente

In: Revista Trilhas, Instituto de Artes, Unicamp, Campinas, n.6, pp.47-55, 1997.
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        “Mas emquanto este tempo passa lento
        De regerdes os povos, que o desejam,
        Dae vós favor ao novo atrevimento,
        Para que estes meus versos sejam:
        E vereis ir cortando o salso argento
        Os vossos argonautas, porque vejam
        Que são vistos de vós no mar irado;
        E costumae-vos já ser invocado”.
        Luiz de Camões, Os Lusíadas (I, v. XVIII)

1. INTRODUÇÃO
As manifestações artísticas mediadas por sistemas de telecomunicação – aqui denominadas de telearte – tem a interatividade e a tele-presença em tempo real como seus traços importantes. A interatividade pode ser reconhecida nos processos de criação, produção, percepção e interpretação das obras de arte que utilizam tanto as técnicas artesanais como as novas tecnologias de comunicação – vindo a ocupar em algumas obras uma posição de destaque. A tele-presença, definida preliminarmente como uma presença indireta ou uma atuação à distância, embora seja um termo de uso relativamente recente [1], tem uma trajetória enraizada em diferentes práticas sociais e culturais. Tendo como pano de fundo a telearte, são feitos comentários sobre a questão da tele-presença e da interatividade, e é exposta a noção de (tele) ausência, definida como sendo a rarefação ou a negação da tele-presença num primeiro momento.
2. TELE-PRESENÇA: O SAGRADO
Através dos tempos, os deuses e as divindades em geral tem sido associadas às mais diversas iconografias, compreendendo fenômenos naturais, formas humanas e animais, objetos, imagens, palavras, etc. Não sendo raro o estabelecimento de locais sagrados, tais como templos e santuários, e de celebrações ligadas, por exemplo, a datas especiais. Essas representações apontam para um mundo sobrenatural, configurando uma forma de tele-presença de natureza mágica e transcendente, e mantendo uma inserção peculiar na vida cotidiana: “Todos os deuses, todos os céus, todos os mundos estão dentro de nós” [2] . Moldadas que são por dogmas e preceitos, elas detem uma certa estabilidade, ou seja, passam poucas alterações ao longo do tempo. Aqui a tele-presença é, por definição, matéria de fé.
A tele-presença implica numa projeção simbólica – uma presença não concreta – que se apresenta e representa em seu lugar, convertendo-se num ritual. No limite, a tele-presença sagrada se chama onipresença. A (tele) ausência se mostra nos encontros com os deuses e divindades, por exemplo, nas peregrinações ou nas cerimônias públicas e privadas, através da submissão do fiel/crente. Contemporaneamente tem-se a própria tele-presença sagrada mediada por sistemas de telecomunicação, principalmente rádio e TV, por vezes adotando a estética do espetáculo profano.
3. TELE-PRESENÇA: PARALELOS E ANTECEDENTES
A tele-presença vista como um deslocamento no tempo e/ou no espaço permite elaborar alguns paralelos. Assim é por exemplo, se aceitarmos a fotografia como um eco do passado: “o espelho com memória ” [3]; ou nos referirmos ao estudo dos corpos celestes pela astronomia e radioastronomia: “Olhando para dentro, no espaço, estamos também olhando para trás no tempo, para trás em direção ao horizonte do universo…” [4]. Já os “panoramas”, populares na Europa do século XIX principalmente no âmbito das assim denominadas “exposições universais”, anunciavam “a ilusão perfeita de estar em meio à natureza”, constituindo-se em dispositivos destinados a simular a presença dos espectadores num ambiente distante e desconhecido, tais como paisagens, cenários urbanos, sítios históricos, etc. [5].
Aceita hoje em dia sem maiores dificuldades, por assim dizer, a tele-presença tem um percurso histórico em que sua aceitação foi sendo constituída – remontando ao telégrafo, ao telefone, ao rádio e à televisão. Esses meios de comunicação, que em seus primórdios causaram espanto e fascinação e até mesmo receio, agora fazem parte do dia a dia. Enquanto isso, outros recursos, tais como o videofone e a infovia podem parecer corriqueiros para alguns, porém algo fantásticos para outros. Revelando com isso o descompasso que pode existir entre inovações tecnológicas e mudanças sociais em cada contexto histórico-cultural. Em todas as épocas os meios de comunicação buscaram ampliar e multiplicar as possibilidades de contato, ou seja, de alcançar e encontrar o “outro”.
O telégrafo, baseado no código Morse, estabeleceu-se como uma forma rápida e condensada de comunicação escrita face ao correio convencional. Seu imediatismo permite considerá-lo como uma forma de presença à distância, isso foi habilmente explorado nos contos de Sherlock Holmes, como por exemplo em The Hound of the Baskervilles [6].
O telefone inaugurou a inter-comunicação verbal pessoa a pessoa à distância, ainda que a precariedade técnica inicial tenha levado à consideração como meio de transmissão unidirecional. Seria redundante comentar os desenvolvimentos técnicos ou ressaltar as tranformações induzidas pelo telefone, cujo substrato é o conceito de rede. Cabe assinalar entretanto um uso premonitório, levado a cabo por Moholy-Nagy em 1922 em suas pinturas pelo telefone Telephone Pictures, expandindo o ideário Construtivista [7].
O rádio trouxe a presença “ao vivo” de notícias, música e canto, entretenimento especialmente de cunho teatral, propaganda comercial e política, etc., criando, em particular entre os anos 30 e 50, uma conexão com o mundo exterior acrescida de uma mística de credibilidade, que só seria sobrepujada pelo advento da televisão. Significativo como exemplo de tele-presença é a sempre citada irradiação, em 1938, da novela The War of the Worlds de H. G. Wells, dirigida por Orson Welles [8].
Com sua luz azulada, a televisão estabeleceu, ao longo do tempo, sua teia por quase todos os recantos do planeta, exercendo e refletindo ponderável influência cultural – aliás assunto esse que vem rendendo um sem número de livros e artigos – e suplantando aquela antes proporcionada pela imprensa e pelo rádio. Um momento significativo em termos de tele-presença é a transmissão ao vivo do desembarque do homem na Lua, em 1969. A “telinha” também começou com limitações, primeiro em preto e branco com programas ao vivo e filmes. Desenvolvimentos técnicos posteriores, em particular a videogravação, a transmissão em rede e o sistema em cores, reforçaram a “naturalidade” da televisão. Mais ainda, aliando o uso do telefone na tentativa de criar um certo diálogo com o telespectador, dando a ilusão de bidirecionalidade. O desenho das antenas de TV reflete também essa evolução, as lineares servem às emissões locais, as parabólicas servem às emissões via satélite, globais.
Pode-se dizer que as transmissões “ao vivo” de rádio e televisão seriam “quentes” em contraposição ao uso de gravações de aúdio e vídeo – permitindo o artifício da montagem – que por sua vez seriam “frias”, observe-se que os termos “quente” e “frio” são aqui empregados relativamente a veracidade das informações. A generalização do uso das gravações em rádio e teledifusão, e mais recentemente a afluência de “efeitos especiais” e a desmistificacão trazida pelo making of, qualificam essa tele-presença como uma tele-representação.
No telégrafo e no telefone a (tele) ausência é dada pela escuta, clandestina ou autorizada. No rádio e na televisão ela localiza-se na censura e, como contraparte, no engajamento. Como formas particulares dessa ausência está a guerra pela informação e contra-informação através de interferências (e.g., usadas durante a chamada “guerra fria”) e de proibições (e.g., o recente banimento das antenas parabólicas no Irã).
4. INTERATIVIDADE: FLUIDEZ E PARTICIPAÇÃO
A interatividade – ação recíproca, conforme o dicionário – está implícita nos processos de criação, produção, percepção e interpretação das obras de arte em geral. A atualidade ou a novidade do termo, diga-se de passsagem exagerada e distorcida pelo marketing, decorre dela estar vinculada às novas tecnologias de comunicação – mais exatamente aquelas dependentes da informática, e da telemática. Até então alguma coisa descrita mais como um diálogo interno, a interatividade adquire também feições externas, operacionalizadas por interfaces específicas, solicitando ações concretas e/ou virtuais dentro da triangulação pessoa – obra/máquina – ambiente natural/construído. Algumas vezes essa interação é simplesmente reativa, em outras envolve uma contribuição mais significativa do participante-navegante.
A interatividade pode ser examinada sob dois prismas distintos, a fluidez da obra e a participação do público. A fluidez funda-se no conceito de obra aberta: “… abertura entendida como ambigüidade fundamental da mensagem artística, é uma constante de qualquer obra em qualquer tempo … que reproduz a ambigüidade de nosso ser-no-mundo” [9]. As poéticas embebidas nas novas tecnologias de comunicação tornaram a obra progressivamente adaptativa, mais permeável e multiforme, ainda mais complexa e controversa se virtual e em base eletrônica/digital. Novos paradigmas vão se decantando, transformando-se concomitantemente as convenções de obra, autor e público. Seja por exemplo a re-criação da natureza morta em um outro contexto, feita pelo autor em Natureza Morta/ao Vivo [10].
A participação do público, tanto individualmente como coletivamente, se perde no tempo, seja na tradição das festas populares, oficiais e religiosas, passando pelo circo, teatro e ópera, seja no mosaico dos espetáculos contemporâneos, sua participação é que convalida o espetáculo/obra. Em algumas circunstâncias é a própria participação que encarna o espetáculo, como é o caso do Carnaval. A partir dos anos 50 e 60, algumas manifestações artísticas estenderam os limites da participação ao envolver o público na elaboração e na definição da obra, tais como, happenings, performances e instalações. Essa aproximação lúdica seria adotada mais adiante em video games, multimídia baseados em compact disc, redes e bancos de dados, e sistemas de realidade virtual.
5. TELEARTE: INTERATIVIDADE E TELE-PRESENÇA
Os trabalhos, ou mais propriamente, os eventos em telearte tem usualmente na tele-presença e na interatividade em tempo real os seus traços mais fortes, em que o espaço virtual tem primazia sobre o espaço real. A virtualidade e interatividade agregam novas formulações ao imaginário contemporâneo em termos de acessibilidade, de caracterização espaço-temporal e de re-composição de valores culturais. A telearte é um subconjunto da arte eletrônica, em particular da “arte interativa” e que opera sobre a união dos recursos da informática e telemática. Recorre-se aqui a uma definição dada por Roy Ascott:
“O termo “arte interativa”, que é uma adição relativamente nova à lista de termos e frases usadas para identificar aquelas teorias, práticas e atitudes que juntas definem arte em toda sua diversidade, refere-se muito mais a um campo de operações, idéias e experiências que simplesmente um gênero passageiro ou um ismo. Ele identifica um amplo leque de experimentação, inovação e autênticas realizações artísticas em uma variedade de meios, que desafiam muitas das nossas suposições do que seja ou possa ser arte. Arte interativa apresenta um fluxo de dados (imagens, texto, som) e uma malha de estruturas, ambientes, e redes (como performance, espetáculo, encontros pessoais, e vivências x particulares) cibernético, adaptativo, pode-se dizer inteligente, tais que o observador pode influir no fluxo, alterar a estrutura, interagir com o ambiente, ou navegar na rede, ficando então diretamente envolvido nos atos de transformação e criação” [11].
A dimensão social e política da tele-presença e da acessiblidade é afirmada por Abraham Moles:
“Ao entrarmos na era da tele-presença nós buscamos estabelecer uma equivalência entre “presença real” e “presença vicária”. Essa presença vicária está destruindo o princípio organizador que a nossa sociedade tem, até agora , construído. Nós chamamos este princípio de lei da proximidade: o que está perto é mais importante, verdadeiro ou concreto do que está longe, menor ou mais difícil de acessar… Ao mesmo, nós vivemos numa era de opulência comunicacional. Nós temos agora a nossa disposição mais fontes de comunicação e de interação do que jamais vamos poder usar em nosso relativamente curto período de vida. Esta é uma era de redes de sistemas socias, decorada com o título futurístico de Sociedade da Informação” [12].
Uma “arte telepresencial”, um conceito formulado por Eduardo Kac, integraria telecomunicação, robótica, computação e interfaces homem-máquina – em que se destacaria uma projeção da presença num espaço-tempo remoto. Um exemplo representativo dessa manifestação é Ornitorrinco, ” a networked telepresence installation”, projeto de telearte e tele-robô desenvolvido em colaboração com Ed Bennett [13].
Na telearte, as questões da autoria e da feitura da obra estão vinculadas à dinâmica processual do espaço-tempo telemático. Nas palavras de Gilbertto Prado:
“Cada artista, em cada participação, contempla, à sua maneira, uma certa possibilidade do mesmo mundo. Trata-se, com efeito, de uma mise en scène de diferentes imaginários, em que não precisam se sujeitar às exigências de uma formalização estrita e anterior, de um sistema fechado de arrazoamentos e de práticas. As lógicas das redes, quer dizer, as maneiras como esses intercâmbios acontecem, celebram assim, sem interrupção, essa liberdade de dispor sempre diferentemente os sentidos do mundo, de poder colocar de outra maneira as coisas e suas significações. A criação em rede é um lugar de experimentação, um espaço de intenções, parte sensível de um novo dispositivo, tanto na sua elaboração como na sua percepção pelo outro” [14].
O problema do imaginário, vítima frequente de equívocos da literalidade e da emulação, é posto claramente por Edmond Couchot:
“É mesmo exatamente lá, no ponto preciso de contato, de passagem, ou seja, na interface do virtual e do real, que o artista é chamado a se recolocar. Margem estreita mas fértil onde o olhar e o cálculo se interpenetram, o extremo toca o extremo, tem-se a hibridização do virtual com o real” [15].
A tele-presença em telearte traz consigo, num certo sentido, uma ausência, ou seja, uma tele-presença X num ponto A, gerada num ponto P, implica numa certa ausência de X em P. Contudo a tele-presença estabelece uma espécie de paródia da ubiqüidade, pois uma tele-presença X, com origem em P, pode “acontecer” em um número finito de pontos A, B, C, …
Aqui a (tele) ausência tem duas faces, uma mais operacional e outra mais conceitual. A primeira pode ser definida pela impossibilidade de acesso às redes de inter-comunicação em geral, seja por limitação de conhecimentos (os iletrados tecnológicos), seja pela escassez de recursos (os “sem-terra” tecnológicos), seja por imposição tecnocrática (os monopólios tecnológicos) – nesse particular, é ilustrativo o caso da Internet no Brasil [16]. De natureza conceitual, a segunda face da ausência situa-se em mistificar a natureza das redes/bancos de dados abertos. Aliás perceptível na difusa crença de que “the net is the message” – parafraseando Marshall McLuhan – e que é passível de crítica análoga àquela feita por Umberto Eco sobre “the medium is the message” [17].
NOTAS
[1] o termo telepresence foi sugerido por Pat Gunkel, segundo Marvin Minsky em seu artigo “Telepresence” publicado na revista Omni de junho de 1980, conforme KAC, Eduardo. “Telepresence Art” in Teleskulptur, n.3, 1993 (Kulturdata, Graz, Aústria), p 51.
[2] CAMPBELL, Joseph. O Poder do Mito. Palas Athena, São Paulo, 1990, p. 41.
[3] “the mirror with a memory”, expressão atribuida a Oliver Wendell Holmes ao se referir ao daguerreótico, conforme NEWHALL, Beaumont. The History of Photography. The Museum of Modern Art, Nova Iorque, 1986, pp. 30-32.
[4] SAGAN, Carl. Cosmos. Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1982, p. 260.
[5] Vide BORDINI, Silvia. “Arte, Imitazione, Illusione: Documenti e Note sulla Pitura dei “Panorami” (1787-1910)”, in Dimensioni, n.1, 1981 (Quasar, Roma), pp. 77-81, 105.
[6] (Sherlock): “Dê-me uma fórmula telegráfica. Está tudo preparado para receber Sir Henry? Creio que basta isto. Mande para Mr. Barrymore, Mansão Baskerville. Qual é o posto telegráfico mais próximo? Grimpen. Muito bem. Mandaremos outra mensagem para o agente do telégrafo de Grimpen. O telegrama para Mr. Barrymore tem de ser entregue em mãos. Se ele não for encontrado, é favor devolver o telegrama para Sir Henry Baskerville, Hotel Northumberland. Com isto ficaremos sabendo, antes do anoitecer, se Barrymore está em seu posto, em Devonshire, ou não”. DOYLE, Arthur Conan. O Cão dos Baskervilles. Melhoramentos, São Paulo, 1981, p. 50.
[7] Vide KAC, Eduardo. “Aspects of the Aesthetics of Telecommunication”, in ACM Siggraph 92 Visual Proceedings. John Grimes e Gray Lorig (eds.), Chicago, 1992, pp. 52-53.
[8] Id. ibid, pp. 51-52.
[9] ECO, Umberto. Obra Aberta. Perspectiva, São Paulo, 1976, pp. 25, 270.
[10] FADON VICENTE, Carlos. “Still Life/Alive”, in Leonardo, vol 24. n.2, 1991, pp. 234-235.
[11] ASCOTT, Roy. “The Art of Intelligent Systems”, in Prix Ars Electronica 1991. Hannes Leopoldseder, (org.), Österreichischer Rundfunk, Graz, Aústria, 1991, p. 25.
[12] MOLES, Abraham. “Design and Imateriality: What of It in a Post-Industrial Society?”, in Design Issues, vol. IV, n. 1&2, 1988 (The University of Illinois, Chicago), p. 25.
[13] Vide KAC, Eduardo. “Ornitorrinco: Exploring Telepresence and Remote Sensing”, in Leonardo, vol. 24, n.2, 1991, p. 233 e também “Telepresence Art”, in Teleskulptur, n.3, 1993 (Kulturdata, Graz, Aústria).
[14] PRADO, Gilbertto. “As Redes Artístico-Telemáticas”, in Imagens, n.3, 1994 (UNICAMP, Campinas), p. 42.
[15] COUCHOT, Edmond. “Une Marge Étroite mais Fertile…”, in Revue Virtuelle, n. 1, 1992 (Centre Georges Pompidou, Paris), s.n.p.
[16] Além das idas e vindas quanto à sua regulamentação e entrada em regime de utilização pelo público em geral, a Internet sintomaticamente vai flutuando entre as páginas de informática e modo de vida dos jornais – ou seja, entre o corporativo e o mundano. Produzindo equívocos paternalistas do tipo: ” A determinação clara da Embratel em oferecer o Serviço de Acesso à Internet em toda sua plenitude através da comercialização de conexões discadas e dedicadas tem como pano de fundo não só permitir ao usuário nacional o acesso às informações existentes lá fora, mas principalmente criar os meios necessários à efetiva disponibilização (sic) de uma Internet de direito e de fato brasileira” – Marcos Assunção, Chefe da Divisão de Serviços Telemáticos da Embratel, in Jornal da Tarde (Jornal de Informática), 23.03.95, p. 6.
[17] ECO, Umberto. “Guerrilha Semiológica”, in Viagem na Irrealidade Cotidiana. Nova Fronteira, São Paulo, 1984, pp. 167-169.


Sobre o AutorCarlos Fadon Vicente (São Paulo, 1945)
e-mail: carlosfadon@hotmail.comDedica-se à expressão pessoal em fotografia desde 1975, especialmente através de ensaios sobre a paisagem urbana e a condição da fotografia enquanto sistema de representação. A partir de 1985 desenvolve pesquisas estéticas e conceituais em arte e tecnologia, com ênfase nas questões da interatividade e da inter-relação visual. É graduado em engenharia civil e artes plásticas pela Universidade de São Paulo e tem o mestrado em artes pela The School of the Art Institute of Chicago. Em 1996 recebeu uma Bolsa Vitae de Artes para projeto em arte eletrônica. Sua produção tem sido apresentada em exposições individuais, coleções públicas e particulares, eventos, mostras coletivas e conferências, e em diferentes publicações, através de portfolios e artigos, no Brasil e no exterior.
Este texto foi publicado inicialmente na revista Trilhas, nº 6, 1997.

postado por [ana pi] 17-10-08

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