Artigo de Nelson Pretto sobre o Mercado das Vacinas

Ciência aberta e vacinas
Nelson Pretto, professor da Faculdade de Educação da UFBA. nelson@pretto.pro.br
Se não bastasse a pandemia da Covid-19 e o pandemônio de uma gestão federal que não dá conta das mínimas ações para o seu enfrentamento, ainda precisamos encarar parcela da população que segue ideias negacionistas, num ataque frontal à ciência. Mas não podemos centrar o debate público apenas na crítica a essa lamentável agenda obscurantista. Temos muito mais a aprofundar, incluindo alguns debates que estão em disputa no próprio campo científico. Refiro-me à Ciência Aberta e a necessária ênfase no Commons, temas mais do que necessários ao analisarmos o mercado das vacinas.
Para além das trapalhadas do governo federal, o que está em jogo agora é um mercado bilionário que fortalecerá ainda mais algumas das maiores farmacêuticas do mundo. Precisaremos de cerca 8 bilhões de doses de vacinas para imunizar em torno de 70% da população mundial, boa parte desenvolvida nesses laboratórios privados, o que têm lhes possibilitado lucros exorbitantes. Nos últimos 12 meses, só a ações da Moderna e da BioNTech subiram 570% e 270%, respectivamente. Isso sem falar no enriquecimento milionário dos seus executivos (O Globo, 24/01).
O artigo bem fundamentado de Leonardo Foletto no site baixacultura intitulado “Quebrar patentes e liberar o conhecimento na pandemia” (//kutt.it/quebrapatente) vai direto ao ponto. O tema da Ciência Aberta precisa estar na pauta dos debates nas comunidades científicas mas, com forte envolvimento da sociedade.
Pesquisamos o tema atentos aos movimentos hackers, softwares livres, recursos educacionais abertos, licenciamentos abertos, entre outros, pois, para nós, o conhecimento é um bem da humanidade e não uma mercadoria a ser negociada. Defendemos princípios que são basilares para que a humanidade possa se desenvolver de forma justa, solidária e sustentável.
No caso da vacina, o Brasil já viveu desafio similar quando do enfrentamento da AIDS nos anos 2000, no governo de FHC, com José Serra seu ministro da saúde. O SUS precisava oferecer aos contaminados pelo vírus um coquetel que tinha, entre outros, o Nelfinavir do laboratório suíço Roche, que queria cobrar preços exorbitantes para que pudéssemos produzir o remédio (Folha, 23/8/01). A negociação não andou e, corretamente, o governo brasileiro quebrou a patente do remédio, viabilizando sua produção pela Fiocruz com um custo 50% menor. Na época, o governo não se recusou a pagar os royalties, o que fez foi apenas considerar a própria legislação que autoriza esses procedimentos em caso emergenciais como era o da época e o de agora.
Em momentos como o atual, é inaceitável o aprisionamento do conhecimento enquanto perdemos uma significativa parte da população mundial por conta da Covid19. Mais do que tudo, precisamos pensar em formas mais humanas de fazer a ciência de fato chegar às pessoas.
 
Link para o pdf da página do jornal, clique aqui.

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GEC em: Conversas Contemporâneas

Nesta quinta-feira, 27/08/2020, acontece mais um encontro das nossas “Conversas Contemporênas”. Desta vez, vamos abordar sobre o contexto educacional da Colômbia frente à pandemia. E teremos como convidada Juliet Carolina Castro da Universidade da Cundinamarca (Colômbia).
Juliet tem graduação em Psicologia pela Universidad Nacional de Colombia, e no ano de 2018 concluiu o mestrado em Educação, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia. A professora pesquisadora que teve orientação da profa. Maria Helena Bonilla (GEC/FACED/UFBA), estudou sobre as implicações de incorporar práticas coeducativas intergeracionais,em torno da cultura digital, na forma como as gerações de crianças e pessoas idosas se relacionam e se representam dentro de um programa intergeracional, localizado na Colômbia.
Todos(as) estão convidados(as)!
 

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O retorno às aulas

Vejo movimentos de governadores e prefeitos no sentido e autorizarem o retorno das aulas presenciais nesse momento.
Temos nos manifestado contrários a isso e alertando para a pressão que vem sendo feita pelas escolas so sistema privado para esse retorno.
Tenho escrito artigos, comentado nas rádios e dado entrevistas sobre o tema. Aqui um pequeno resumo, começando com o artigo publicado hoje em A Tarde.

O perigo do retorno das escolas.

Nelson Pretto – professor da Faculdade de Educação/UFBA – nelson@pretto.info

Participei esses dias, como avô, de uma aula de meu neto de seis anos em uma escola particular em São Paulo. Eram cerca de 25 crianças nessa faixa de idade e a brava professora se desdobrava de um lado para o outro (da tela!) para fazer com que aqueles meninos e meninas pudessem ficar atentos às tarefas. A aula era sobre o mundo de ontem e de hoje e o que se via na tela eram imagens do livro texto, escritas na tela feitas pela professora e comentários divertidos da turma.

“Tá me ouvindo, fessora? Qual a página?”

“Júlia, liga a câmera”. “João, seu microfone tá desligado”.

A aula transcorria e eu, atento, tudo observava.

Tarefa árdua de professoras e professores do sistema privado de educação obrigados a continuar as aulas através da internet. Do interior de suas casas, com todos os demais afazeres típicos do período de confinamento, nossas colegas estão se desdobrando para dar continuidade ao processo educativo.

Seguramente está sendo uma difícil empreitada. Por outro lado, não podemos permitir o retorno agora das aulas presenciais, pois a escola é, essencialmente, um lugar de afeto, de abraço e de companheirismo. Escola é contágio no sentido pleno do termo. Não condiz, portanto, com as necessárias regras para conter a proliferação do coronavírus.

A Fiocruz alertou que o retorno às aulas colocaria em risco 9,3 milhões de adultos e, justo por isso, é uma temeridade esse retorno do presencial, tanto no sistema privado como no público.

Outro dia, em um debate na TV, ouvi uma longa fala de um representante das escolas particulares insistindo na urgência do retorno às aulas. Para sustentar seu argumento, trazia dados de pesquisas indicando a segurança da empreitada. Justo naquela semana, pesquisa divulgada pelo New York Times indicava que crianças de 0 a 10 anos não estavam imunes ao vírus e, o pior, jovens de 10 a 19 anos têm, em relação ao vírus, comportamento exatamente igual a adultos. Ou seja, são potencialmente portadores e disseminadores do vírus.

Além disso, em sua fala, o representante das escolas privadas não mencionou uma única vez a palavra professor. Serão as professoras e professores, mais uma vez, as maiores vítimas de uma atitude como essa.

Os esforços que estão sendo feitos pela categoria para viabilizar o chamado ensino remoto não são suficientes para uma plena educação da juventude, entre outros fatores, por conta da enorme desigualdade digital no país e no mundo. No entanto, é necessário que se aperfeiçoe e intensifique o que está sendo feito para que se amplie o acolhimento daqueles estudantes que estão fora da escola.

Precisamos, portanto, muita cautela nesse momento e retomar o funcionamento das escolas pode por em risco boa parte do esforço que os governos estaduais e municipais vêm fazendo para conter a proliferação da Covid19.

Publicado em A Tarde de 05/08/2020, pag. 03. Aqui o pdf da página do jornal.

Nas minhas ultimas colunas de rádio tenho comentado sobre isso. Estão todas aqui: www.radios.pretto.info.

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Políticas de TI para a Educação na pandemia

Aqui o documento que produzido por Nelson Prettoeu e Karina Menezes (UFBA|FACED) junto com Leonardo Nascimento (UFBA|ICTI), Vinicius Ramos (UFSC|CIT) e Tel Amiel (FE|UnB) sobre as tecnologias de informação para a educação em tempos de isolamento social.

Introdução

Em função da necessidade de distanciamento social e dos desafios de se pensar a continuidade da educação formal em todos os níveis de ensino através de mediação informacional, percebemos que as grandes corporações tecnológicas vêm buscando, de forma insistente, estar presentes nos sistemas de educação, tanto privado como público1. Tais corporações passaram a ofertar planos de serviços quase mirabolantes, colocando à disposição, de maneira “gratuita” recursos para que a educação continue de forma remota, durante o período de pandemia.

Essa corrida desenfreada para dar uma resposta social diante da pandemia tem se desdobrado em contratações, doações ou “parcerias” que evidenciam o projeto de desvalorização da formação dos sujeitos, de privatização da educação pública e do fortalecimento dos valores do capital na educação. Também evidencia os riscos da entrega dos dados escolares, funcionais, e científicos (implicando alunos, professores, servidores e famílias) das escolas, institutos e universidades à essas empresas. As consequências do uso das tecnologias digitais destas corporações poderá viabiliza a ampliação de mecanismo de controle e vigilância sobre uma parcela significativa da população e fortalecendo o que vem sendo denominado de capitalismo de vigilância2. Dados do projeto Educação Vigiada indicam que quase 70% das secretarias estaduais de educação e instituições públicas e ensino superior já têm parcerias com duas empresas (Google e Microsoft) para serviços essenciais de tecnologia da informação.3

Nós defendemos que é de fundamental importância o controle sobre os dados gerados pelas ações nas universidades, tanto frutos das pesquisas como nas ações de ensino e extensão. De tal forma a garantirmos que estes dados fiquem sobre a guarda da própria universidade ou de algum ente público, garantindo a sua segurança e inviolabilidade. Outro relevante aspecto diz respeito à proteção de dados e metadados institucionais e pessoais, inclusive de comportamentos e interações online, de tal forma que os mesmo não sejam utilizados para outras finalidades que não estritamente aqueles para os quais foram coletados.

São conhecidas, na imprensa internacional, notícias sobre o uso dos dados pessoais, ainda que agregados , como forma de monetização dessas grandes empresas4. Esse movimento está associado à redução de orçamento e ao sucateamento da infraestrutura e equipe de apoio de tecnologia de informação nas instituições de ensino superior5. Acreditamos que ser necessário aproveitarmos o momento atual para repensar as políticas institucionais no sentido de construir políticas de tecnologia da informação, de Educação Aberta, Acesso Aberto e Ciência Aberta para os desafios atuais e futuros. Para superar esses desafios, urge que as Universidade brasileiras desenvolvam esforços conjuntos e coletivos no sentido de introduzir, de forma paulatina, soluções livres abertas e auditáveis, em servidores que estejam sob seu controle e atuando em regime federado de tal forma a atender às comunidades do coletivo das instituições.

Considerando a urgência do momento, nós sugerimos caminhar na disponibilização de uma plataforma livre (não-proprietária) e de código aberto em cada uma das instituições, que passariam a atuar de forma articulada e federada. Para tal, se faz necessário fortalecer os setores de tecnologia da informação das IFES com recursos e pessoal especializado. Reconhecemos que esse é um difícil momento para que todas essas ações e intervenções possam ser viabilizadas em curto prazo, no entanto, como estamos alertando desde muito, esse é um processo que precisa ser iniciado imediatamente e de forma ainda mais urgente, evitando, dessa forma, que esse processo seja inviabilizado de forma permanente.

Propostas

A título de exemplo inicial, fruto de nossas demandas, pesquisas e experiências internacionais, sugerimos que se trabalhe desde já para oferecer, paulatinamente, a toda a comunidade universitária as seguintes soluções que já demonstraram sua viabilidade em escala institucional. A relação abaixo está sendo atualizada de forma colaborativa na wiki: http://bit.do/politicas_ti.

I – Serviços para solução de compartilhamento e sincronização de arquivos segura, protegida, criptografada, em servidor local institucional

Já existem experiências de utilização pela solução NextCloud associada à solução Onlyoffice (próximo item) com diversas outras possibilidades complementares, como editores de texto colaborativos, ferramenta de gerenciamento de projeto, clientes de email, entre outros. Temos, a título de exemplo, um primeiro e básico levantamento desta solução em implantação na UFBA, UFSC, UnB e UFCE, além da experiência da RNP com o sistema Owncloud e diversas experiências internacionais. Estas experiências, neste sentido, poderiam ser utilizadas como referência para serem ampliadas e, complementarmente, podendo se transformar em uma rede federada.

II – App/Plataforma para a criação, edição e compartilhamento de documentos de texto, apresentações, planilhas, imagens, etc. livre, gratuito e multi-formato

Onlyoffice: Essa é uma solução que já está integrada ao NextCloud (item I anterior). Uma solução robusta, utilizada por diversas organizações e instituições de ensino superior, em escala. Alternativamente, pode-se integrar o Nextcloud com outra suite, chamada Collabora.

III – App/plataforma para transmissão, gravação e hospedagem de podcasts/video

Essa é uma solução que já está integrada ao NextCloud (item I anterior)

IV – App/plataforma para cliente de e-mails, calendário, gerenciamento de contatos e chat de texto

Tanto o Nextcloud quanto o OnlyOffice já possuem essas facilidades.

V – App/plataforma para vídeo-chamadas com compartilhamento de tela e gravação segura, protegida, criptografada, em servidor local institucional

Há a experiência da RNP e de diversas instituições de ensino com o software livre mconf (um projeto brasileiro, baseado no Big Blue Button) apontam para um caso de sucesso em escala federal. Plugins permitem a integração ao Nextcloud6 e outras plataformas de ensino, como o Moodle. Jitsi é uma solução robusta que oferece comunicação encriptada para grupos e pode ser instalada com muita facilidade com escala.

VI – App/plataforma para transmissão, gravação e hospedagem de vídeo-aulas

Existem diversas instituições como a UFSM e UFBA que já desenvolvendo a plataforma de vídeo SOLAR da mesma forma que a RNP está intensificando e aperfeiçoando o sistema de Conferenciaweb, baseado no Mconf. O OpenCast é utilizado por diversas instituições de ensino superior para gravação remota de palestras e administração de vídeo. Com funcionalidade similar a outro software, o Kaltura que poderia ser experimentado.

VII – App/Plataforma que possibilite um ecossistema de rede social, onde estudantes, professores e técnicos possam trocar informações, arquivos, entre outros

Já integrado ao Nextcloud.

VIII – App/Plataforma para gestão de referências bibliográficas integrados aos documentos de texto

Zotero, que é um sistema robusto para gerenciamento de referências e arquivos, utilizando formatos diversos incluindo ABNT, que tem servidor disponível em https://github.com/zotero/dataserver e clientes para todos os tipos de sistema operacional.

À guisa de conclusão

Importante salientar que os exemplos aqui apresentados são esforços individuais e coletivos que já estão em desenvolvimento pelas comunidade envolvidas em cada um destes projetos. Existem diversos casos específicos de sucesso e outras alternativas que são, não apenas possíveis, mas viáveis. Deste modo, seguimos acreditando que a incorporação do conjunto das IPES e outros órgãos federados de pesquisa neste esforço daria maior escopo a estas iniciativas no Brasil. Por fim, pensamos em uma educação e uma sociedade onde a construção de um ecossistema informacional protegido e livre é o alicerce para a construção de uma base tecnológica soberana e cidadã para o país.

1 Ainda com uma pequena e heroica resistência de iniciativas dispersas nesse último caso.

2 ZUBOFF, S. The Age of Surveillance Capitalism: The Fight for a Human Future at the New Frontier of Power: Barack Obama’s Books of 2019. Profile Books, 2019.

3 https://educacaovigiada.org.br, acesso 05 Jul. 2020.

4https://www.eff.org/wp/school-issued-devices-and-student-privacy https://www.thedailybeast.com/google-accused-of-selling-users-personal-data-to-ad-companies https://www.nbcnews.com/tech/tech-news/google-sells-future-powered-your-personal-data-n870501

5PARRA, H. et al. Infraestruturas, economia e política informacional: O caso do Google Suite for education. Mediações, v. 23, n. 1, p. 63–99, 2018. <10.5433/2176-6665.2018v23n1p63>

6Disponível App Store do Nextcloud. https://github.com/sualko/cloud_bbb

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Campanha de Nelson Pretto para liberação das redes sem fio.

Escrevi no jornal Correio da Bahia. Falei na Rádio Metrópole. Divulguei tudo por aqui, mas mesmo assim, acho que precisamos ir mais longe, insistir no tema e fortalecer uma campanha. Atenção  @kamenes, @annaizabel e demais artistas geniais, vamos criar cartazes e cobrar a abertura das redes sem fio de empresas (públicas e privadas), universidades (públicas e privadas), escolas (públicas e privadas) e até mesmo das pessoas para aumentarmos a conectividade das pessoas. Isso sem falar em fazer pressão para que tenhamos políticas públicas para garantir a conectividade da população brasileiro.
No artigo do Correio da Bahia (23 e 24/05/2020, p. 24) com o título: Educação e solidariedade (tecnológica): liberem seu wifi, falo um pouco mais de educação e o conclui assim:

“Além disso, por que não pensar em uma solidariedade tecnológica? Poderíamos contribuir com os mais vulneráveis que não têm acesso pleno à internet com um gesto simples: liberando o acesso de nossas redes sem fio domiciliares e empresarias. Quantas empresas estão com suas redes sem uso por conta do trabalho remoto e que poderiam abri-las para a população?

Simples gesto que possibilitaria aumentar ainda mais as redes de solidariedade e acolhimento.”

Veja artigo inteiro aqui.

Ouça meu comentário na Rádio Metrópole de 29/05/2020 sobre o tema.

Rádio Metrópole 29/05/2020: Libere seu Wi-Fi

Todos os meus comentários estão disponíveis em muitas plataformas. O acesso pode ser dar por aaqui radios.pretto.info

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Caio Formiga: Vamos fazer uma videoconferência?

Fonte: https://liberdadenaculturadigital.wordpress.com/2020/05/23/192/

Estamos em maio de 2020 e o vírus Sars-Cov-2 começa a chegar ao pico de contaminações no Brasil. Esse vírus foi descoberto na China, em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan. Alguns meses depois, a doença causada por esse vírus, Covid-19, tornou-se uma questão de saúde mundial, espalhando-se por todos os continentes em uma velocidade assustadora e atingindo o status de pandemia. Essa doença ataca o sistema respiratório e provoca uma especie de pneumonia, por isso o tratamento demanda os respiradores e ventiladores, sem esses equipamentos os contaminados podem morrer. Nem todos que “pegam a Covid-19” morrem, mas isso não faz com que a doença não seja perigosa, afinal em menos de 6 meses levou a óbito milhares de pessoas em todo o mundo. Enquanto escrevo, a doença atingiu 21 mil óbitos no Brasil, de acordo com a página do Ministério da Saúde, criada exclusivamente para informar sobre os avanços da doença.

A crise provocada pelo Covid-19 não pode ser percebido como uma questão apenas de saúde, como nos lembra o recém publicado livro, “Educação em tempos de pandemia: Reflexões sobre as implicações do isolamento físico imposto pela COVID-19”, disponível para leitura on-line ou download em pdf.

[…] enfrentamos uma crise sem precedentes, porque combina fatores sanitários globais, políticos, econômicos, educacionais, entre outros, não podemos perder de vista que estamos em meio a uma ameaça à vida (em diferentes dimensões e proporções). Para a sociedade brasileira, em particular, realizar o enfrentamento desta situação desde suas peculiares e, por vezes, fragilizadas estruturas, já é um grande desafio, todavia, esse enfrentamento se torna ainda maior devido ao conflito político, em exposição diariamente pelas mídias, que impede a efetividade do Estado na garantia de políticas de assistência aos mais vulneráveis e amplia a insegurança da população, que não sabe, ao certo, como proceder para se manter em segurança.

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Educação e isolamento: transformar a educação pública

Salete Cordeiro

Professora da Faculdade de Educação da UFBA. Pesquisadora do GEC/FACED/UFBA. E-mail salete.noro@ufba.br

Pensar em oferecer condições educativas a milhares de estudantes das escolas públicas, que nesse momento permanecem em casa, é um grande desafio. Uma das principais soluções elencadas para enfrentar a crise seria a utilização das tecnologias digitais, através do uso de diversas plataformas comerciais, criando condições para que os alunos recebessem formação instrumental e conteudista via web.
Um leque de questionamentos pode ser aberto a partir dessa alternativa, mas é importante, antes disso, saber quantos dos alunos da rede pública têm acesso à internet e dispositivos em suas casas? Segundo dados da pesquisa TIC domicílios 2018, no Brasil, apenas 39% dos lares possuem simultaneamente internet e computador. Em relação à classe C, dentro desse percentual, o acesso é de 43% e desce para 7% quando referido às classes D e E, o que indica que essa alternativa não atende a todos. Aí está o fosso digital que aumenta as desigualdades, pois aqueles que não tiverem acesso aos bens culturais serão, certamente, os mais prejudicados.
Alguns ainda sugerem que as escolas sejam pontos de acesso, porém essa não é a melhor alternativa em função da pandemia, além de ser de conhecimento de todos que agrande maioria delas não possui suficiente infraestrutura física e de rede. Dados TIC Educação 2018 indicam que apenas 25% possuem laboratórios de informática com a quantidade média de 6 a 15 computadores funcionando e conectados à internet simultaneamente. Esse panorama evidencia não somente a falta de infraestrutura, mas a ausência de incentivos para o desenvolvimento da cultura digital, o que retraiu a criação de propostas pedagógicas e didáticas que partissem dos cotidianos escolares, que por sua vez seriam de grande importância.
Entretanto essas ausências induzem a um repensar tanto as políticas públicas de consolidação do acesso à banda larga para toda a população, como do fortalecimento da escola pública, com uma ação contundente no sentido de superar uma educação centrada no repasse de conteúdos. Os professores(as), alunos(as) e suas comunidades poderiam estar envolvidos na construção de conteúdos diversos, contando suas experiências vivenciais, cotidianas, analisando a realidade a partir das notícias que lhes chegam entre tantas outras possibilidades. Tudo isso, visando a construção de conteúdos em múltiplos formatos que poderiam ajudar suas comunidades no enfrentamento da calamidade, como por exemplo, produção de podcasts, vídeos, fotografias para serem compartilhados nas redes, blogs ou nas rádios web das escolas e das comunidades, tudo isso funcionando nesse momento de maneira remota.
Não temos respostas prontas, o que sabemos é que precisamos respeitar e fortalecer a autonomia da escola pública e da sua comunidade como espaço de partilha de saberes e construção de conhecimentos.

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Documento do GEC: Educação em tempos de pandemia

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Educação em tempos de pandemia: Reflexões sobre as implicações do isolamento físico imposto pela COVID-19.

 Baixe o livro em pdf aqui

 Leia o livro completo aqui

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O GEC na Marcha pela Ciência no Brasil

O Grupo de Pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias (GEC) da Faculdade de Educação da UFBA estará presente na quinta, dia 07 de maio de 2020, nas redes sociais em defesa da Ciência (aberta e cidadã), saúde, educação e cultura.
Aqui, algumas das nossas manifestações. Usem a vontade se acharem boas:

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: Ciência aberta: uma luta pelo direito ao conhecimento” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: Ciência aberta: uma luta pelo direito ao conhecimento” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: Em defesa da ciência aberta e cidadã” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: Pela produção e uso de Recursos Educacionais Abertos (REA) na educação” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: O conhecimento não é propriedade de ninguém. Pela ciência aberta e cidadã” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: por uma ética hacker” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: em defesa do software livre na educação. Não às plataformas web proprietárias” http://www.gec.faced.ufba.br

“GEC/FACED/UFBA na Marcha pela Ciência: Não existe solução grátis, seus dados estão sendo chupados” http://www.gec.faced.ufba.br

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Precisamos proteger quem cuida: pandemia, violência e mulheres

O Covid-19 acarreta para a sociedade não apenas um problema de saúde pública, mas intensifica e agrava outros já existentes, como a violência doméstica, principalmente aquela praticada contra as mulheres. Com a necessidade de permanecer em casa, o tempo de convívio entre os membros da família é maior e, entre seus integrantes, muitas vezes está o agressor. Os índices de violência e feminicídio apresentam-se assustadoramente crescentes a cada ano, embora sejam as mulheres, em muitos lares, as provedoras em termos financeiros e de cuidados.
Segundo dados recentes do relatório da ONG Oxfam, mulheres que vivem em comunidades rurais e países de baixa renda empregam cerca de 14 horas diárias ao trabalho não remunerado relacionado ao cuidado, dedicando-se cinco vezes mais que os homens nesse tipo de atividade. Dados do IBGE 2016 revelam que as mulheres envolviam-se mais de 18 horas semanais às tarefas domésticas e cuidado de pessoas, o que correspondia acerca de 73% a mais de horas que os homens (10,5 horas semanais), e a maior desigualdade encontrava-se na região Nordeste, onde elas dedicam-se a essas atividades 19 horas semanais, perfazendo um total de 80% a mais de horas que os homens. O cuidado refere-se ao trabalho que envolve todas as atividades domésticas como limpar, cozinhar, lavar, buscar água, cuidar de pessoas doentes, crianças, idosos, etc. Atualmente, com a necessidade de bloquear a cadeia de disseminação do vírus, e consequente fechamento das escolas e dos centros que cuidam de idosos ou de pessoas não autossuficientes, a sobrecarga de trabalho cresce para as mulheres, somando-se mais horas de cuidado e manutenção dos afazeres domésticos. Como se não bastasse, ainda enfrentam o aumento da violência dentro do próprio lar.
Na Itália, país afetado fortemente pelo vírus, o problema da violência contra a mulher também está presente, e vem sendo atacado por várias frentes: entidades públicas e privadas; presença de centros antiviolência; telefones (Telefono Rosa) e aplicativos para denúncias; campanhas como o “Libera, puoi”; a visibilidade e publicização através da adesão de vários artistas nessa luta, pela dignidade e vida das mulheres. Entretanto, evidenciou-se no início de março a diminuição no número de ligações e denúncias. Houve uma queda de 55,1% no número de ligações: dos 1.104 telefonemas recebidos entre 8 e 15 de março de 2019, foram registrados apenas 496 no mesmo período de 2020, justamente no momento em que todos foram chamados a permanecer a maior parte do tempo em casa. O que evidencia a triste realidade: para muitas mulheres e seus filhos, nem sempre o lar é um lugar seguro. Situação semelhante foi constatada na China, no período do combate ao Covid-19.
A diminuição do número de denúncias na Itália é decorrente do fato de que as mulheres não têm a chance de sair de casa para fazer as denúncias; ou ainda, como seus companheiros também não saem, não há oportunidade de fazerem ligação ou de recorrer às autoridades. O problema agrava-se, pois essas mulheres são expostas a duas ameaças: a primeira, o contágio, uma vez que as casas de refúgio estão com uma quantidade já considerável de positivos ao vírus não podendo abrigá-las; a segunda, sem espaços alternativos e permanecendo em casa após a denúncia, agressor e vítima continuam sob o mesmo teto, aumentando significativamente o risco de novas agressões.
No Brasil as autoridades precisam estar atentas. Em nosso país é feito um registro a cada dois minutos de casos de violência doméstica. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019, são 263.067 casos de lesão corporal dolosa. Os casos de feminicídio registrados em 2018 chegam a 1.206, desses 29,8% dos registros são de mulheres entre 30 e 39 anos e 70,7% das vítimas tinham no máximo Ensino Fundamental. Outro dado importante é que em 88,8% dos casos, o autor foi o companheiro ou ex-companheiro.
Diante de dados alarmantes que não param de crescer ano após ano, precisamos de medidas enérgicas para barrar essa bruta realidade que atinge tão drasticamente nossa sociedade. Precisamos de políticas públicas contundentes, com o poder público, em todas as esferas, engajando-se na luta com ações imediatas como campanhas, verbas para casas de abrigos e todo tipo de assistência às vítimas. Outra frente que deve ser encarada como necessária e urgente é aquela que começa nas escolas, que têm como uma de suas funções a formação para a cidadania. A educação deve fazer ecoar os princípios que sustentam a dignidade humana e a vida. Precisamos colocar na pauta de nossas aulas, seja qual for a área do conhecimento, temas relacionados às questões de violência, gênero e abuso. Devemos parar e pensar um pouco se estivermos preocupados com a formação das novas gerações e se nelas realmente depositamos a esperança de um futuro melhor. Reflitamos: o que uma criança ou jovem vai aprender na escola se em sua mente está o registro da agressão doméstica que presenciou entre seus genitores? Sua necessidade é de acolhida, precisa de ajuda para compreender e processar o que se passa na sua casa, que o sucedido não é culpa sua, nem ela é a responsável por solucionar esse problema. Negligenciar a realidade de tantas crianças e jovens é de certa maneira fortalecer a manutenção de uma realidade dramática, que nos mata um pouco a cada dia. Precisamos, todos juntos, enfrenar essa situação há muito tempo insustentável e que, em tempos de Covid-19, não se calem as denúncias e ações em favor da não violência e da valorização da vida.
Salete Cordeiro, professora da Faculdade de Educação da UFBA. Pesquisadora do GEC/FACED/UFBA
Este texto fui publicado originalmente no Jornal Correio da Bahia, 29.04.2020, 10:52:49
 

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