Caio Formiga: Vamos fazer uma videoconferência?

Fonte: https://liberdadenaculturadigital.wordpress.com/2020/05/23/192/

Estamos em maio de 2020 e o vírus Sars-Cov-2 começa a chegar ao pico de contaminações no Brasil. Esse vírus foi descoberto na China, em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan. Alguns meses depois, a doença causada por esse vírus, Covid-19, tornou-se uma questão de saúde mundial, espalhando-se por todos os continentes em uma velocidade assustadora e atingindo o status de pandemia. Essa doença ataca o sistema respiratório e provoca uma especie de pneumonia, por isso o tratamento demanda os respiradores e ventiladores, sem esses equipamentos os contaminados podem morrer. Nem todos que “pegam a Covid-19” morrem, mas isso não faz com que a doença não seja perigosa, afinal em menos de 6 meses levou a óbito milhares de pessoas em todo o mundo. Enquanto escrevo, a doença atingiu 21 mil óbitos no Brasil, de acordo com a página do Ministério da Saúde, criada exclusivamente para informar sobre os avanços da doença.

A crise provocada pelo Covid-19 não pode ser percebido como uma questão apenas de saúde, como nos lembra o recém publicado livro, “Educação em tempos de pandemia: Reflexões sobre as implicações do isolamento físico imposto pela COVID-19”, disponível para leitura on-line ou download em pdf.

[…] enfrentamos uma crise sem precedentes, porque combina fatores sanitários globais, políticos, econômicos, educacionais, entre outros, não podemos perder de vista que estamos em meio a uma ameaça à vida (em diferentes dimensões e proporções). Para a sociedade brasileira, em particular, realizar o enfrentamento desta situação desde suas peculiares e, por vezes, fragilizadas estruturas, já é um grande desafio, todavia, esse enfrentamento se torna ainda maior devido ao conflito político, em exposição diariamente pelas mídias, que impede a efetividade do Estado na garantia de políticas de assistência aos mais vulneráveis e amplia a insegurança da população, que não sabe, ao certo, como proceder para se manter em segurança.

Uma outra dimensão da pandemia é o “recolhimento social”, já que mesmo em nossas casas temos mantido nossas redes afetivas, solidárias, subjetivais e cooperativas. No meu caso, sou asmático, a doença é muito perigosa, e por isso estou praticado esse recolhimento desde o dia 15 de março de 2020. Para que essas redes se mantenham atuantes e ativas, muitos têm realizado videoconferência.

Diante do limite de participantes das chamadas do “ZAP”, os derrubamentos e vazamentos do ZOOM, o anúncio da integração do Meets no Gmail para uso grátis, acabei descobrindo um pouco mais sobre o Jitsi e até sobre a sala virtual do GEC.

E isso que vou relatar a seguir…

***

Tenho participado de vídeo chamadas do WhatsApp (“ZAP”), principalmente quando o número de participantes é até 4 pessoas. Sei que a dona do WhatsApp, o FACEBOOK, é um dos grandes símbolos do capitalismo de vigilância, mas eu continuo usando-o para grande parte das trocas de mensagem, por duas razões: 1) as pessoas que converso usam essa ferramenta; 2) a criptografia de ponta a ponta me traz um ar de segurança, inclusive, no site, há um link para um relatório técnico.

Numa dessas conversas diárias, fui convidado para participar de uma reunião com um grupo de professoras de uma escola do campo, a Etalc. Essa reunião seria comigo e mais 4 professoras. Normalmente elas usam o “ZAP”, mas devido a minha presença precisávamos de uma solução que incluísse a todos.

Decidi procurar um software livre (de código aberto, open source) para usar. Inicialmente, testei o Jitsi Meet uma solução criptografada, 100% de código aberto, gratuita, sem necessidade de conta, não usa dados como mercadoria, disponibilizada pela  Jitsi.org. O Jitsi Meet possibilita que seja criado um ambiente de videoconferência apenas informando um nome para sala (click aqui para testar). Depois é só compartilhar o link. Quem for participar acessa o link direto do navegador e pronto, simples como deveria ser!

No primeiro teste, abri uma sala usando meu desktop. Pedi a um amigo que entrasse no link com seu computador (um notebook) e conversamos por alguns minutos (eu com áudio apenas; ele com áudio e vídeo; depois invertemos). Pedi que ele deixasse o computador ligado e permaneceu funcionando por horas sem cair. Esse primeiro teste foi um sucesso e me deixou esperançoso para a reunião com  as professoras da Etalc.

No momento da reunião, compartilhei a sala (https://meet.jit.si/ETALC) e aguardei as professoras. Todas elas estavam usando smartphone, para essas pessoas foi necessário instalar um app, Jitsi Meet, de uma loja de aplicativos (click aqui para fazer o downlod).

falha_JITSI

Uma vez que todos tinham instalado o app Jitsi Meet os problemas aumentaram, pois a conexão era perdida e solicitava “Rejoin Now” a todo momento. Enquanto pensava e pesquisava por algo que pudesse resolver rapidamente o problema de “rejoin com smartphones”, uma solução foi sugerida por uma das professoras: “vamos tentar no Zoom”. E assim a reunião recomeçou, não encontramos problemas para acessar com vários dispositivos diferentes, mas todos tiveram que instalar algo: elas tiveram que usar o aplicativo da Zoom no smartphone; eu, um programa no computador desktop (Linux Mint); tudo disponível gratuitamente no site da empresa (https://zoom.us/download).

Finalizada a reunião, tentei descobrir mais sobre os problemas do Jitsi. Busquei na comunidade Jitsi.org sobre problemas relacionados, achei informações que a ferramenta suporta até 75 e que em breve querem ultrapassar 100 (link), mas nada conclusivo. Li um pouco sobre o mecanismo de peer-to-peer, mas nada sobre os problemas com dispositivos móveis. Como assim?

De lá para cá, tenho usado o ZOOM para reunir-me com as professoras e professores dessa escola. Essa solução me causa incomodo, tanto ideológico, como operacional, já que a 40 minutos a sala é derrubada, sendo preciso criar uma nova sala e convidar todas as participantes para reconectar. A ZOOM faz isso de proposito, para “incentivar” aos usuários que faça um de seus planos. Muito chato, mas não tinha outra opção.

Nesse tempo, fiz novos testes com o Jitsi. Testei, com outro amigo, dessa vez com celular e desabilitando o peer-to-peer e não teve problemas. Sei que o serviço de banda larga que usamos aqui em Salvador é diferente daquele disponível nas cidades do interior, principalmente em localidades rurais, normalmente não há opções, apenas um prestador de serviço. Portanto, o mau funcionamento no outro dia pode ser uma questão de qualidade da banda larga e não da ferramenta em si.

De toda forma, fico com o pé atras de usar o Jitsi com esse grupo de professores, pois se  na hora da reunião não der certo, será desastroso. Em milissegundos, se espalharia a ideia, errada, de que o software livre não funciona. E, mais rápido que a Covid-19, uma barreira ideológica estaria posta, sendo necessário um outro vírus ou uma grande falha de segurança de uma das plataformas proprietárias para abrir uma nova brecha.

Hoje, decidi retornar as pesquisas para achar um software livre (de código aberto, open source) para acessar com vários dispositivos diferentes (smartphones, computadores, laptops, etc). Descobri um comparativo entre ferramentas na wikipedia.

Foi então que conheci o BigBlueButton, um software livre de código aberto (click no link para acessar o git do projeto). Que pode ser instalado em um servidor linux para disponibilizar o serviço na web.

A ideia de ter serviço rodando em meu computador pessoal, não me agradou, mas há um demo no site do projeto (https://demo.bigbluebutton.org/gl/), onde é possível usar à vontade. Esse demo funciona similar ao Jitsi, mas me pareceu ainda melhor, pois tanto faz, se a conexão é via um computador ou smartphone, o BigBlueButton não demanda de nada instalado. Há outros pontos diferentes do Jirsi: o criador da sala precisa de uma conta; devido ao aumento da demanda a função de gravação esta fora do ar; as reuniões estão limitadas a 60 minutos; o link da sala é fixo mas não tem o nome definido pelo criador; a interface tem trechos em inglês, apesar de quase toda com suporte para PT-BR.

BigBlueButton_tela_inicial

Ei, pera aí! Eu já vi essa interface. Exatamente, nas reuniões do GEC. No nosso grupo de pesquisa, usamos o Conferencia Web, mantido pela RNP. Neste ambiente temos uma sala (https://conferenciaweb.rnp.br/webconf/gecfaced) que é exatamente igual a essa. De acordo com o site da RNP a solução Conferencia Web é desenvolvida pela empresa MCONF. No site da MCONF, a única solução de videoconferência chama-se Elos, que usa o software BigBlueButton para a videoconferência. Me parece que a Conferencia Web é uma versão do Elos desenvolvida sob demanda para a RNP.

Então dá para usar a Conferencia Web/RNP com os professores? Sim, eu posso iniciar a videoconferência, depois disponibilizar o link para quem for participar https://conferenciaweb.rnp.br/webconf/caio-formiga. Porém apenas quem tem conta no portal da RNP pode criar salas.

Elos_planos

Outra opção, que na prática usa o mesmo software é usar o serviço Elos da MCONF, que possibilita aos assinantes a infraestrutura para quem não quer ter o BigBlueButton rodando em sua maquina pessoal. A MCONF tem dois planos o Free e o Premium. Na página do Elos uma grata surpresa, devido a Covid-19 a MCONF decidiu aumentar “o limite do plano Free de 4 para 15 usuários na conferência”. Com isso eu criei a minha sala no Elos, que usa o BigBlueButton, e todos podem entrar nela sem problemas, basta acessar o link: https://elos.vc/caio-formiga

Após a “promoção”,  pode ser uma solução razoável assinar o plano Premium. No meu caso, as reuniões com os professores devem reunir entre 6 a 12 pessoas, o custo fica no máximo R$ 72,00. Esse valor seria mais em conta do que o valor pago ao Zoom que justamente no momento da pandemia escolhe apenas lucrar, criando limites ao invés de abrir fronteiras. Isso é bizarro, mas não é espantoso. No final do século passado o então empresário, Bill Gates, disse que seu sistema operacional era como o opio, e eles queriam as pessoas viciadas.

Embora três milhões de computadores sejam vendidos a cada ano na China, as pessoas não pagam pelo software. Um dia eles pagarão, penso eu. E mesmo enquanto eles estão roubando, queremos que eles nos roubem. Eles ficarão como que viciados e um dia, de algum modo, vamos descobrir como cobrá-los na próxima década. [Em entrevista a revista Fortune, dia 20 de julho de 1998]
FONTE: Arquivos da Revista Fortune, link

Seguirei como os testes…em busca de formas de acesso livre, priorizando as formas gratuitas, mas se o Jitsi não funcionar bem para meu contexto, tudo bem; estou aberto a pagar por serviços de tecnologia, mas sem perder os princípios de valorização do software livre, e me distanciar da lógica mais atrasada das empresas de software proprietário.

Bom domingo para tod@s!
Fiquem em Casa.

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