A implementação do PRONACAMPO: da inserção das tecnologias digitais à formação de professores nas escolas do campo
Coordenação: Maria Helena Silveira Bonilla
Palavras-chave: políticas públicas, tecnologias digitais, formação de professores do campo
Objetivos e Justificativas
O governo brasileiro lançou, em março de 2012, o Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo), com o objetivo de oferecer apoio técnico e financeiro aos Estados, Distrito Federal e municípios para implementação da política de educação do campo, a partirdo desenvolvimento de quatro eixos de ação: gestão e práticas pedagógicas, formação de professores, educação de jovens e adultos e educação profissional e tecnológica.
Tal política foi instituída durante o governo Lula (2003-2010) como estratégia para o resgate da dívida do país para com a população do campo, população que, historicamente, teve negado o direito a uma educação de qualidade, uma vez que os modelos pedagógicos implementados no país ora marginalizavam o mundo rural, ora vinculavam-se ao mundo urbano, ignorando a diversidade sociocultural do povo brasileiro, especialmente aquela expressa na prática social dos diversos sujeitos do campo. O Pronacampo integra essa política buscando promover a educação digital e o uso pedagógico da informática nas escolas do campo e quilombolas, com o investimento de R$ 1,8 bilhão por ano, para o oferecimento de conexão internet e informatização das escolas do campo, dentre outras ações. Atualmente, 90% das escolas do campo não têm acesso à internet, e 70% não possuem laboratório de informática. O objetivo é que, até 2014, sejam instalados laboratórios de informática em 20 mil escolas e pontos de acesso à internet em 10 mil escolas do campo, o que é pouco, visto que o número de escolas é de aproximadamente 83.000 no país, mas significa um começo, frente ao histórico quadro de políticas públicas inadequadas ou ausentes para a população do campo, especialmente no que diz respeito à infraestrutura tecnológica e à formação de professores para a incorporação das tecnologias digitais nos processos pedagógicos e para a formação da cultura digital entre essa parcela da população.
Com base nesse contexto, em 2012-2013 desenvolvemos a pesquisa «Da inserção das tecnologias digitais à formação de professores nas escolas do campo: as potencialidades do PRONACAMPO», com o objetivo de compreender como o Pronacampo incorpora, avança e/ou supera as perspectivas postas nos programas e projetos desenvolvidos de 2003 a 2011 pela Diretoria de Políticas de Educação do Campo, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI/MEC), no que diz respeito ao acesso, concepções e uso das tecnologias digitais. No decorrer do período (2012-2013) poucas ações
foram desencadeadas (a análise das mesmas será socializada no relatório da pesquisa), visto
que a portaria que institui oficialmente o Programa e define suas diretrizes gerais só foi
publicada em 01 de fevereiro de 2013 (Portaria n. 86/MEC), quase um ano após o seu
lançamento. Dentre estas ações estão o cadastro das escolas do campo para o recebimento de laptops educacionais, o que já começou a ocorrer no início de 2013, e a atribuição dada à Universidade Federal de Santa Catarina — UFSC — para a elaboração dos cursos de formação dos professores das escolas do campo para o uso desses equipamentos.
Portanto, os objetivos postos na pesquisa anterior ainda estão em aberto, necessitando continuarmos a análise das ações encaminhadas até este momento, bem como acompanhar o processo de elaboração dos cursos de formação de professores para o uso dos laptops educacionais (a orientadora desta pesquisa já está em contato com a equipe da UFSC e terá acesso a todo o processo), e a chegada e incorporação desses laptops nas escolas do campo, além de mapear, acompanhar e analisar as ações que possam vir a ser propostas pelo governo brasileiro. Desta forma, damos continuidade ao processo de compreensão de como o Pronacampo incorpora, avança e/ou supera as perspectivas postas nos programas e projetos desenvolvidos até então pela Diretoria de Políticas de Educação do Campo, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI/MEC), no que diz respeito ao acesso, concepções e uso das tecnologias digitais nas escolas do campo e nos processos de formação de professores para essas escolas.
Metodologia
A análise de um contexto não pode ser visto como recorte, decomposição, divisão-redução do mesmo em elementos mais simples e sim como compreensão, acompanhamento dos acontecimentos dinâmicos que vão ali emergindo. De acordo com Martins (1998, p.27 ), o
que é importante nessa análise é a aceitação da heterogeneidade que constitui o contexto e a
compreensão de que o exercício de reflexibilidade requerido por essa análise exige um amplo espectro de referenciais. A observação, a investigação, a escuta, o entendimento, a descrição dessa complexidade se dá por óticas e sistemas diversos. O papel do pesquisador é se aproximar, compreender o fenômeno, fazendo uma leitura do objeto, o que implica uma postura aberta.
Na busca por compreender as concpções, diretrizes e formas de operacionalização do Pronacampo para o acesso e uso das tecnologias digitais e para a formação dos professores, buscaremos aporte nos estudos sobre pesquisa qualitativa, tendo em vista este tipo de pesquisa, segundo Bogdan e Biklen (1999, p.47-51 2 ), utilizar como fonte de dados o ambiente natural, de forma que as ações são melhor compreendidas se vinculadas ao movimento de seu contexto histórico e social. Para analisar esses dados em toda a sua riqueza, cada informação, observação, manifestação, omissão, precisa ser tomada como potencial para a compreensão do objeto de estudo, o que significa fazer uso da “descrição”(COULON, 1995) como forma de estabelecer relações e se aproximar dos processos que se movimentam nesse contexto. Para tanto, estaremos atentos para não confundir descrição com relato, o qual não dá conta da natureza interna das coisas, limitando-se a exprimi-la. A descrição é um modo de apresentação que permite, ao mostrar a organização interna do foco de estudo, apreender seu sentido.
Essa descrição deve, portanto, ter uma base hermenêutica, ao buscar uma dimensão interpretativa, ao fazer uma leitura da história acontecendo, ao desvelar a constituição do sentido em seu extrato histórico, o que traz para primeiro plano a consideração do novo, do inaudito, e derruba o objetivismo próprio do método científico cartesiano. Buscamos a constituição do sentido desse novo Programa e das potencialidades do mesmo para a melhoria da infraestrutura tecnológica, para a formação dos professores do campo e para a constituição da cultura digital nesse contexto. Para tanto, continuaremos realizando o levantamento e análise da documentação do mesmo, bem como das reverberações que forem ocorrendo na sociedade brasileira, nos movimentos sociais e nas instituições envolvidas com sua operacionalização, a fim de identificar as suas formas de operacionalização e as articulações que forem se constituindo para tal operacionalização. Também continuaremos acompanhando a chegada das ações do Programa em um município bahiano, o município de Macarani, município onde uma integrante do Grupo de Pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias (GEC) é professora e atua, como técnica, na secretaria municipal de educação frente à coordenação de projetos especiais. Ainda, manteremos forte interlocução com a equipe da UFSC que está desenvolvendo os cursos de formação dos professores do campo para o uso dos laptops educacionais, para compreendermos as diretrizes e concepções da proposta.
A análise desses materiais será realizada à medida que os mesmos forem coletados, de forma a descrever o contexto, compreendê-lo, revelar suas tensões e seus múltiplos significados, à luz do campo teórico em uso no Grupo de Pesquisa em Educação Comunicação e Tecnologias — GEC, e a partir das discussões e estudos que se desencadeiam no cotidiano do GEC.
Viabilidade e Financiamento
Por se tratar de uma pesquisa qualitativa com base na coleta de documentos pela internet, e interação com pesquisadores de outros municípios e estados, não teremos necessidade de deslocamento para a coleta de dados. A partir da infra-estrutura (computadores conectados à Internet, banco de dados, biblioteca) disponível na Faced, especialmente no Grupo de Pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias – GEC, grupo a que a coordenadora desta pesquisa está vinculada, será possível realizar todas as atividades previstas. Em virtude disso, não há necessidade de aporte de recursos financeiros para o seu desenvolvimento. Também, como esta pesquisa está articulada às demais pesquisas já desenvolvidas e/ou em desenvolvimento pela pesquisadora e demais membros do GEC (grupo de pesquisa que compõe a Linha de Pesquisa Currículo e (In)formação, do Programa de Pós-graduação em Educação da UFBA), consideramos perfeitamente viável desenvolver o projeto no período de um ano, com a participação de dois bolsistas PIBIC.
Resultados e impactos esperados
– ampliação dos horizontes de compreensão em torno da imbricação dos temas políticas públicas, tecnologias digitais e formação de professores do campo;
– produção e publicação de artigos a respeito da temática em estudo, de forma a socializar os resultados da pesquisa com outros pesquisadores e grupos de pesquisa;
– participação em seminários da área, em nível regional e nacional, com o objetivo de divulgar a pesquisa e fortalecer o debate sobre o tema;
– fornecimento de subsídios para os trabalhos finais de graduação, mestrado e doutorado dos integrantes do grupo de pesquisa GEC, no que diz respeito às políticas públicas para uso das tecnologias nos processos de formação de professores do campo;
– alimentação do banco de dados público do Grupo de pesquisa Educação Comunicação e Tecnologias.
Cronograma de execução
Agosto de 2013 a janeiro de 2014:
– Levantamento dos materiais que forem publicados pela sociedade civil, movimentos sociais e demais instituições envolvidas com a operacionalização do Programa;
– Levantamento e coleta de documentos oficiais relacionados ao PRONACAMPO;
– Acompanhamento das ações propostas pelo Programa ao município de Macarani-BA;
– Interação com os pesquisadores da UFSC para conhecimento da proposta do curso de formação de professores do campo para uso dos laptops educacionais;
– Alimentação do banco de dados do GEC;
– Leituras e estudos dos documentos coletados e de bibliografia sobre os temas em foco;
– Identificação e discussão dos principais conceitos que fundamentam a pesquisa;
– Participação em eventos.
Fevereiro de 2014:
– Relatório parcial da pesquisa.
Março a maio de 2014:
– Acompanhamento das ações propostas pelo Programa ao município de Macarani-BA;
– Interação com os pesquisadores da UFSC para conhecimento da proposta do curso de formação de professores do campo para uso dos laptops educacionais;
– Análise dos dados coletados, à luz do referencial teórico selecionado;
– Produção de artigos sobre o tema;
– Participação em eventos.
Junho e julho de 2014:
– Relatório final da pesquisa
Referências bibliográficas
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